Ver postagem de denúncias nas redes sociais no dia-a-dia comprova que vivemos em um show de horrores. Surpresa por cima de surpresa em todos os campos. Uma delas surgiu há dias. Pessoas compartilhavam revoltadas notícias que carros foram multados ao redor de um restaurante durante a noite na cidade de Natal. “Indústria da multa” Diziam alguns. Um absurdo, exclamavam outros.
Na mesma linha, uma segunda surpresa hoje. Pessoas compartilham revoltadas a notícia de que estão multando os carros que estão parados na ciclovia.
O tom da “denúncia” é sempre de revolta. Mas a revolta não é com o fulano que estaciona em local proibido. Ao ver o tom de revolta dos compartilhamentos a sensação primeira é a de que alguma injustiça foi feita. Mas ao ler o artigo percebemos que é apenas mais um caso de pessoas revoltadas por um motivo curioso: O Estado começou a aplicar a lei. A revolta é com a atuação da polícia que, corretamente, está multado todos aqueles que estacionam em locais impróprios.
O argumento muitas vezes utilizado pela população? “Nunca tem gente na ciclovia”. Ao escutar este tipo de argumento devemos perceber que em boa parte das experiências de ciclovias, primeiro foram dadas as condições da existência de ciclistas, apenas depois eles apareceram. Multar todos aqueles que estacionam em ciclovias é o primeiro passo para dar condição de existência para o ciclista. Outros retrucam: deveriam avisar antes. Bem, pede-se que toda pessoa que dirige tenha habilitação e os locais, normas e sinais para estacionamento estão previstos no código de trânsito. É obrigação de todo condutor saber o básico e não é preciso ser um perito em normas de trânsito para saber onde pode e não pode estacionar.
Todos, se entrevistados, reclamam da falta de fiscalização, das pessoas que estacionam em local proibido ou cometem infrações no trânsito. Mas no país do jeitinho, do tudo dá, tudo pode, aplicar a lei é motivo de crítica. Ao ver alguns artigos de “revolta” contra a polícia ou agentes de trânsito temos, por vezes, a impressão que lemos tudo errado, que caímos no mesmo buraco de coelho que a Alice ou que o mundo está ao avesso.
No imaginário popular a polícia só é boa para aplicar a lei quando está na favela. Quando ela decide aplicar a lei em locais “não habituais” os infratores agem com indignação. É preciso alertar: a lei existe para todos e é função da polícia notificar todo ato de infração, independente de cor, idade, sexo, raça, gênero, nacionalidade, religião, etc. etc. etc.
Alguns argumentam: onde estão eles em “x” e “y” locais? Bem, todos nós sabemos que o Brasil carece de contingente no serviço público. No serviço público, tudo sempre falta. Seja na polícia, na educação ou saúde (com exceção do judiciário, lá sobra, tudo sobra – para confirmar é só observar as construções faraônicas que dão abrigo a tais instituições). Neste sentido, não é culpa da polícia não estar em todo local o tempo inteiro. As mesmas pessoas que pedem um “estado mínimo” são as mesmas que reclamam da falta de fiscalização e muitas vezes são também as mesmas que reclamam quando a fiscalização chega até elas. Todo brasileiro parece gostar da lei, mas só quando está bem longe dele e vejamos em que situação chegamos. Brasileiros revoltados porque o Estado começou a fazer o que sempre deveria ter feito: “botar jeito nesse cabaré”.