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Cautela e caldo de galinha

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Pradera com a camisa do ABC / Foto: autor desconhecido
Pradera com a camisa do ABC / Foto: autor desconhecido

Pradera corre em direção a lateral e seu alvo não é a bola. Na beira do campo, observando como quem tem juízo, está Alberi, agora vestindo a camisa alvirubra. Depois de nocautear titulares e reservas do América, Pradera parte enfurecido pra cima do negão, que não vê outra alternativa, se não fugir em disparada para o vestiário. A confusão estava formada.

A cena descrita nas linhas acima infelizmente – ou felizmente – não foi presenciada por mim. Ela aconteceu em 1977, na fase de ouro do futebol potiguar. Foi presenciada de perto pelo jornalista Maurício Pandolphi – aquele mesmo grisalho, bigodudo e de queixo avolumado que apresentava o programa Grandes Temas da TV Universitária. Pandolphi foi o primeiro repórter de pista (de TV) do futebol do Rio Grande no Norte. Naquela época só existia a TVU por essas bandas.

Época saudosa em que o estádio lotava. Natal havia acabado de ganhar uma nova praça esportiva, o estádio Castelo Branco – Castelão – que depois virou o finado Machadão, e onde agora temos a Arena das Dunas. Diferente do que existe hoje, uma Arena maravilhosa e moderna, mas que até o momento não possui batismo, nem nome e, que sobrevive às custas do cofre público, com rendas pequenas e muitos espaços vazios.

Mas o que nos importa agora é a cena narrada no primeiro parágrafo. Segundo Maurício, o fato ocorreu num ABC e América e “entrou pra história, não pelo primor do espetáculo, mas sim pela sensacional briga que aconteceu em campo”.

A confusão começou quando um jogador do América passou a mão nas partes traseiras de Pradera, que segundo Maurício era um armário de aço de quase dois metros de altura. “Todos os jogadores dos dois times, incluindo os reservas, os diretores, os torcedores que invadiram o gramado, a polícia e, dizem as más línguas, até alguns coleguinhas da imprensa, que tomaram partido na briga”.

No final das contas, depois de bater em todos que se atreveram a encará-lo, Pradera partira pra cima de Alberi, que teimara em fugir da confusão. Serelepe, no auge de sua forma física, o atacante conseguiu escapar para o vestiário, se livrando por pouco de levar uns tremendos tapas.

E quem também se livrou de tomar uns tabefes foi esse cronista que vos escreve. E por mais de uma vez.

Em 2007, campeonato brasileiro da Série C, o ABC enfrentava o Atlético de Goiás. Eu ali na margem do módulo um do Frasqueirão na minha rotineira tarefa de registrar os melhores momentos do jogo em fotos. Estava colado ao banco do time goiano. Certo momento da partida, envolvido pela emoção do jogo, me posicionei entre a linha lateral e o banco de reservas – e confesso agora que de propósito – obstruindo a visão dos suplentes.

Quando menos espero, levanta o goleiro reserva do Atlético, que segue em minha direção, com uma luva maior que a minha cabeça, me chamando pra briga. Confiando nos dois policiais que estavam ao meu lado, encarei aquele armário de dois metros. Ele, obviamente, recuou com a presença das autoridades. Eu, que não sou besta nem nada, mudei de lado no segundo tempo. Assisti o restante do jogo do lado oposto, onde poderia me esconder facilmente diante de qualquer investida do goleiro enfurecido.

Já em 2012, final do Estadual, contra o América, começou um quebra quebra do lado oposto do vestiário do ABC. Se não me falha a memória, Boaventura, Jérson e Clébão estavam envolvidos.

Já entregando os pontos, fiquei na boca do túnel, onde costumeiramente eu, o roupeiro Joca, o preparador de goleiros Wlamir, os seguranças Fabio e Hansen e mais uma penca de gente que não deveria estar ali assistiam aos jogos em visão privilegiada, mesmo sem permissão da arbitragem. Normalmente – com exceção de Leandro Saraiva – faziam vistas grossas.

Mas o fato é que jogadores e comissões técnicas invadiram o campo para apartar a confusão e, eu observando e guiado pela emoção do momento, corro pro campo em direção aos brigões. Queria, na verdade, defender a honra do meu time, que perdia o jogo e o título para o rival.

Não à toa, decidi compartilhar essa história com meus leitores. Uma cena que tinha tudo para ser digna de orgulho para mim. Se não por um simples detalhe: esperei uns longos 30 segundos antes de decidir invadir o gramado e entrar na briga. Só entrei mesmo depois que os ânimos se acalmaram e a agressões gratuitas tiveram fim.

Definitivamente, não sou nenhum Pradera. Já dizia o sábio, quem procura, acha. Cautela e caldo de galinha nunca fez mal a ninguém.