Todo ano é a mesma coisa: assim que sai o resultado do Sisu, chovem reclamações sobre Sisu/Enem. Aqui em Natal, no grupo da UFRN (veja bem, UFRN) do facebook pessoas despejando bairrismo: “vem o povo de fora roubar nossas vagas”. ROUBAR VAGAS. Como assim “roubar” vagas? Existe, por meio do Sisu/Enem, um método de garantir vagas de acordo com a naturalidade?
Outros, vi desejando a volta do vestibular tradicional da Comperve/UFRN. Ao entrar no perfil deles, vi que a maioria nasceu depois da metade da década de 90, ou seja, no último ano de realização do vestibular tradicional, todos eles estavam no Ensino…. Fundamental. Francamente, né?
Eu fiz quatro vestibulares tradicionais, passei em dois. No Enem, também fiz quatro e obtive boas notas em todas elas. Num ano, inclusive, cheguei a passar num curso de biomédica – coloquei por colocar, jamais faria matrícula, sou Humanas II.
Por falar nesse caso que coloquei um curso qualquer para testar nota (fiz isso em três seleções do Enem), muitos reclamaram que estavam dentro da lista de aprovados e, no último dia, ficaram de fora, porque candidatos de cursos mais concorridos que não obtiveram a nota escolheram aquele. Eu até entendo (veja bem, entendo) a revolta da pessoa ficar de fora do curso que ela escolheu por conta de outra que só escolheu “para entrar logo na universidade”. Entendo, mas não é justificável. Ora, se uma pessoa estudou mais que a outra, por que ela não pode escolher o curso? Não defendem tanto a meritocracia? Ela está aí e, nesse caso, no mesmo patamar – AMPLA CONCORRÊNCIA.
Voltando à prova. Como disse antes, fiz as duas provas. A prova da Comperve/UFRN não media a capacidade intelectual do candidato, mas sim a capacidade de memorização dele. Algo completamente diferente do Enem que a cada ano tem aumentado a qualidade. Isso reflete até no próprio “mercado educacional”. Hoje, os alunos têm o privilégio de não ter um palhaço (que nem de longe pode ser comparado ao artista/profissional palhaço) fantasiado travestido de professor ensinando dicas de memorização de fórmulas, datas, nomes etc. Hoje, os professores precisam realmente estudar para dar uma aula com que o aluno não só aprenda, mas também saiba o porquê de estar estudando aquilo.
E sabem quem disse isso há mais de 30 anos? Paulo Freire (que se estivesse vivo estaria contente com esse método), isso mesmo, o maior pedagogo brasileiro, acusado pela direita de ser “comunista”, porque era simpatizante da Teologia da Libertação (uma corrente de Esquerda dentro do catolicismo). Suas teorias educacionais foram e continuam sendo usada nos maiores países capitalistas (Estados Unidos, Alemanha, Suécia, Suíça, França etc.). Esperaram mais de 30 anos para colocarem em prática as teorias de Paulo Freire que só veremos os primeiros resultados significativos daqui uns vinte anos, no mínimo.
Por que tanto tempo? Simples, mudanças em políticas públicas educacionais não são que nem fórmulas matemáticas, elas não são exatas, precisam de constante atualização e demoram tanto porque nosso país é grande e populoso, com “culturas” (não sei se posso utilizar nesse sentido essa palavra – me corrijam antropólogos) diferentes. Criar um método que respeite todas essas diferenças requer tempo e respeito à diversidade e, mesmo assim, há chance de falha, por isso que o estudo tem ser diário.
Para terminar, desejo que quem reclame do Sisu/Enem comece a encarar de uma forma diferente o estudo. Treine a criticidade e não a memorização. Não se deve estudar para “passar no vestibular”; deve-se estudar para a vida.