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Outro Olhar Sobre Umarizal: Um Estudo Preventivo

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Por Ivenio Hermes (*)

Localizada na região do Médio Oeste do Rio Grande do Norte, o município de Umarizal atingiu na noite de quarta-feira, 6 de agosto de 2014, a marca de 14 crimes violentos letais intencionais no ano e se mantém na liderança no número de assassinatos por habitantes no Rio Grande do Norte.

Foi a morte da dona-de-casa Renata Kézia da Silva, de 19 anos, no bairro Lalins, a 14ª do ano de 2014, vítima do inconformismo machista de Deocleciano Benedito da Silva, que não soube lidar com a separação. O assassino, segundo informes da Polícia Militar, já responde por outro homicídio cometido no município de Severiano Melo.

Umarizal (1)

Ocorre que entre a 14ª vítima e a 13ª não decorreram nem 24 horas, quando desconhecidos assassinaram Uidenilson de Morais, de 38 anos, portador de necessidades especiais que lhe renderam a alcunha de “Aleijado de Naza”.

Considerando os 6 homicídios que ocorreram em Umarizal no mesmo período de 2013 e os 14 referentes a 2014, obtemos um aumento percentual de 133%. Esse aumento nos faz lembrar que o total de homicídios no município em 2013 foram 7, portanto, em pouco mais de 7 meses deste ano já se tem o dobro de ocorrências.

Aos olhos da maioria, 7 ou 14 crimes violentos letais intencionais num estado que está com cerca de 1100 durante o ano, não alarma, mas considerando o número de habitantes estimado em pouco mais de 10 mil, o município do Oeste Potiguar vive uma situação preocupante com relação ao quadro da violência, pois encerrou 2013 com a taxa de 64,26 cvli, o equivalente a 64 homicídios por universo de 100 mil habitantes. Essa taxa mencionada é obtida através de um pequeno cálculo e usada como referencial pela Organização das Nações Unidas (ONU) e centenas de institutos que pesquisam a violência homicida ao redor do mundo. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera que, quando essa taxa se eleva acima 10, a qualidade de vida diminui sensivelmente e o homicídio passa a ser considerado epidêmico.

Umarizal (2)

Em 29 do último mês de junho, a cidade aparecia com um índice de 100,99% de assassinatos dentro do referido quantitativo populacional, e na visão ampliada de hoje, com as novas ocorrências, Umarizal apresenta 14 registros de homicídios sendo 2 mulheres e 12 homens, 5 com idade entre 15 e 29 anos e 9 acima de 29 anos de idade.

Umarizal (3)

As etnias atingidas foram 4 da branca para 10 da negra e da parda, que são muito confundidas, e além disso, foram 5 solteiros para 9 com algum tipo de relacionamento conjugal informado, sendo 4 casadas e 5 em união estável. Esses recortes por gênero, faixa etária, relacionamento e etnia mostram uma certa tendência para alguns grupos que podem servir de base para políticas preventivas, pois nem todo problema de segurança precisa exclusivamente da polícia ou da segurança pública de impacto para ser resolvido. Afinal, é de interesse social e político que Umarizal perca esse destaque negativo por estar entre os 21 municípios mais violentos do Rio Grande do Norte, que fica ainda em pior situação ao ser considerada sua posição dentro deste grupo.

Umarizal (5)

Pelo número absoluto de ocorrências de cvli, Umarizal ocupa a 13ª posição no ranking dos 21 mais violentos, contudo, pela taxa referencial, fica em 1º colocado com 128,52 cvli por cem mil habitantes, isto é, 5 vezes mais que a taxa referencial nacional que é de 25,3 cvli x 100 mil habitantes e quase 13 vezes acima do valor considerado aceitável no mundo, que é 10 cvli x 100 mil habitantes.

Agregando dados de pesquisa realizada para o Conselho Estadual de Direitos Humanos e Cidadania do RN (COEDHUCI) e de outras fontes, cujos parâmetros se adequam ao sistema de contagem de cvli estabelecido pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP), consolidamos algumas informações para identificar a evolução homicida no Rio Grande Norte, e desse estudo que está em andamento, extraímos um quadro sobre a situação de Umarizal.

Umarizal (6)

Lembrando o que a população em 2003 não era a mesma de hoje, utilizamos a flutuação populacional a partir de 2010, e nos anteriores usamos a ponderada apenas como referência. Entre 2003 e 2008 os homicídios aparentemente possuíam uma variação cíclica, repetindo-se a cada dois anos, talvez em função da subnotificação, que no nordeste é apontada por diversos especialistas como sendo acima de 10% dos casos de assassinatos, como mostra Waiselfisz (2014, p. 16) quando diz que esse índice é 11,2%.

Ainda que a gestão estratégica venha sendo implementada pela atual gestão de segurança, os gestores não conseguirão lograr êxito completo e serão sempre alvo de críticas, pois seus projetos se deparam com o maior dos problemas, o baixo efetivo, como NÓBREGA JÚNIOR (2011, p. 29) fundamenta nosso discurso:

O Rio Grande do Norte foi o estado com maior impacto negativo no efetivo de suas polícias. Entre 2003 e 2006 o quantitativo das polícias civis foi reduzido em mais de mil profissionais. O que revela bem isto foi o impacto visto nas taxas de policiais por cem mil habitantes. Em 2003 a taxa de policiais civis foi de 83,9 agentes para cada cem mil potiguares. Em 2006 essa taxa caiu para 47,2, representando uma queda robusta.

O exemplo que Umarizal nos traz é inegavelmente de alerta! A partir de 2009 até os dias atuais o município sofreu mais. Seu pior ano foi em 2010, com 15 homicídios e 137,70 cvli por cem mil habitantes e esse cenário volta a se repetir em 2014.

Por não se tratar de uma situação nova, é evidente que se reconhece a ausência de políticas elementares para evitar essa situação que agora apavora continue a ocorrer, aumentando a responsabilidade dos gestores, não só na segurança, mas em todas as esferas da gestão pública.

Umarizal não pode ter sua situação piorada e as soluções precisam surgir antecipadamente, pois enquanto se pode deter a aceleração do vagão da violência homicida, é preciso agir, para desacelerar, frear e finalmente movê-lo para trás. A partir do momento que ele adquire certa velocidade e passa ter efeitos colaterais típicos do crime violento que produz a morte, daí o trabalho policial aumenta, e algumas tentativas de freá-lo bruscamente pode descarrilá-lo, provocando mais violência que se reproduz e retorna mais alimentada e disposta.

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(*) Artigo inspirado nas matérias “Mulher é morta à facadas e município contabiliza 14 homicídios”, de Fábio Vale, on line no Jornal De Fato em 7/8/2014, disponível em: < https://db.tt/3s00Z4Wf > e “Dona-de-casa Renata Kézia é morta a facadas por ex-marido em Umarizal”, de Cezar Alves, on line no Jornal De Fato em 7/8/2014, disponível em: < https://db.tt/wmjz2U8l >

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SOBRE O AUTOR:

Ivenio Hermes Ivenio Hermes é escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves, ativista de direitos humanos e sociais e pesquisador nas áreas de Criminologia, Violência Homicida, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial.

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REFERÊNCIAS:

NÓBREGA JÚNIOR, José Maria P. da (2009a), “Homicídios em Pernambuco: dinâmica e relações de causalidade”, in Coleção Segurança com Cidadania, Ano 1, Nº 3, Homicídios: Políticas de Controle e Prevenção no Brasil. ISSN 1984-7025.

WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mortes matadas por armas de fogo 1979-2003. Brasília: UNESCO, 2004.

______. Mapa da violência 2011. Os jovens do Brasil. Brasília. Instituto Sangari; Ministério da Justiça, 2011.

______. Mapa da violência 2013. Acidentes de trânsito e motocicletas. Rio de Janeiro: CEBELA-FLACSO, 2013.

______. Mapa da Violência 2014: Os Jovens do Brasil – 2014, Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana, RITLA, Instituto Sangari, Ministério da Saúde e Ministério da Justiça.

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DIREITOS AUTORAIS E REGRAS PARA REFERÊNCIAS:

É autorizada a reprodução do texto e das informações em todo ou em parte desde que respeitado o devido crédito ao(s) autor(es).

HERMES, Ivenio. Outro Olhar Sobre Umarizal: Um Estudo Preventivo. Disponível em: < http://j.mp/1r1EQSi >. Publicado em: 09 ago. 2014.