Os Números da Violência Homicida e a Crise de Efetivo
Por Ivenio Hermes
Aos atualizamos o Mapeamento da Violência Homicida no RN em 9 de junho às 19hs, confirmamos o total de 789 homicídios em 2014.
Esse número confirma o que Marcos Dionisio Medeiros Caldas sempre diz em nossas reuniões de estudo, que antes da copa ultrapassaremos a marca dos 800 cvli.
O crime sem investigação e sem a continuidade punitiva da ação do Estado tem levado a população potiguar a sérios problemas de insegurança, e essa impunidade não será detida pelo policiamento ostensivo, pois a cadeia de policiamento está quebrada em um dos mais preciosos elos.
Se Polícia Civil está reduzida no interior e os esforços da Polícia Militar não são aproveitados como deveriam, o crime se endemiza e cria paradigmas no interior do Estado.
Vejamos a situação do Vale do Assú.
Observando os dados da Microrregião do Vale do Assú, está notória que a concentração dos crimes ocorre na cidade polo, Assú. Dos 26 homicídios ocorridos na região, 14 deles, 54%, ocorreram em Assú, seguida de longe, pela cidade de Ipanguaçu com 4 cvli, 15%.
Embora Ipanguaçu tenha apenas 4 homicídios, não significa dizer que o município esteja longe da estatística nacional, ao contrário, com seus 27 cvli por 100mil/hab ultrapassa a marca nacional de 25,3 e Assú vem logo atrás com 24,84 cvli por 100mil/hab.
E os perigos do vale não param por aí, a situação da Delegacia de Assú não é nada boa com sua responsabilidade pelos municípios de Assú, Carnaubais e Itajá. Esses três municípios fazem parte da Microrregião do Vale do Assú, composta por mais seis municípios, recepcionando assim um alto número de ilicitudes, dentre elas os crimes de pistolagem e tráfico de drogas.
Em 2013 o efetivo da delegacia era 12 agentes. Sem a contratação de policiais, o efetivo foi reduzido para 7 agentes, sendo que atualmente só conta com 6, pois um deles foi removido para Natal para participar do cinturão de segurança da COPA 2014.
Esse deslocamento de agentes para trabalhar no megaevento esportivo de futebol se repete em várias delegacias do interior. No topo dessa pilha de problemas de pessoal, o Governo do RN demora a contratar novos policiais, protela a promoção de um novo curso de formação para o quadro reserva formado pelo concurso 2009 e ainda faz transferências de policiais do interior para a capital sem observar o critério da permuta, desprestigiando a população sofrida e sem a visibilidade dos pequenos centros.
A diferença de efetivo mostra seus resultados: Em todo o ano de 2013 ocorreram 20 homicídios, sendo 11 deles contra menores de 29 anos de idade. Em apenas 5 meses de 2014 já ocorreram 15 homicídios, sendo 7 contra menores de 29 anos de idade. Nesse panorama, a cidade de Assú já ultrapassou a média nacional, com 31,94 cvli por 100mil/hab.
A coisa piora quando se lembra a realidade de que existe uma CDP (Central de Detenção Provisória) no segundo andar da delegacia, com uma população carcerária de aproximadamente 70 detentos divididos em 4 celas.
Esse é o resultado das políticas públicas de segurança que vêm sendo praticadas no interior do Rio Grande do Norte, dentre elas a falsa política de interiorização da Polícia Civil. E o exemplo daquilo que está acontecendo em Assú e no Vale do Assú evidencia o aumento dos crimes violentos letais intencionais na proporção direta à diminuição do efetivo.
O fato é que o volume de crimes da Microrregião do Vale do Assú deveria suscitar uma delegacia com estrutura ampla, contando com vários delegados, escrivães e agentes que pudessem desempenhar sua função precípua de investigar.
Não adianta promover políticas de combate ostensivo sem o lastro da investigação para a ampla promoção da justiça, essa é a verdade que precisa ser esclarecida de uma vez por todas, e ao invés de sucatear o efetivo já desgastado do interior, o reforço e a revitalização deveriam urgentemente acontecer.
A Divisão de Homicídios na Capital, delegacias bem aparelhadas, investigação, perícia técnica, ampliação do efetivo… Sonhos que a segurança pública “para inglês ver” da COPA arrasou.
Por onde anda o projeto do novo curso de formação? Ele é um dos itens importantes para o sucesso do Brasil Mais Seguro.
Numa estrutura onde o Governo possuísse a genuína intenção de debelar o crime em todos os seus matizes, o “Vale do Assú” poderia ser uma delegacia regional da Polícia Civil, assim como outras áreas do Estado.
Até quando essa será a realidade do Estado Elefante?
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SOBRE O AUTOR:
Ivenio Hermes é escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves, ativista de direitos humanos e sociais e pesquisador nas áreas de Criminologia, Violência Homicida, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial.
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HERMES, Ivenio. Perigo no Vale do Assú. Disponível em: < http://j.mp/1kVr28n >. Publicado em: 09 jun. 2014.