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Brasil década de 1970: Milagre econômico, futebol e tortura

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Luciano Capistrano – luciano.capistrano@natal.rn.gov.br

Historiador/Comissão Municipal da Verdade

 

3ae7Virgílio foi morto no dia 29 de setembro de 1969. Conforme Gorender (1998, p.169): Após a primeira sessão de pau-de-arara, dispôs de energia psíquica e atlética para entrar em luta corporal com a equipe de torcionários da OBAN (Operação Bandeirantes). Mataram-no a pontapés.

Dirigente do sindicato dos químicos e farmacêuticos de São Paulo. Nasceu no município de Santa Cruz em 1933. Dedicou sua vida a política. Com o golpe militar passou a viver na clandestinidade, até ser morto nas dependências dos órgãos de segurança e ter seu nome na lista dos desaparecidos políticos. Nilmário Miranda e Carlos Tibúrcio informam que:No arquivo do DOPS/PR, em documento do SNI (Serviço Nacional de Informações) de 31/10/1969, lê-se Virgílio Gomes da Silva (Jonas), falecido por resistir à prisão. No arquivo do DOPS/RJ há um documento do CIE (Centro de Informações do Exército) intitulado “terrorista da ALN com curso em Cuba” que relata no texto situação em 21 de junho, morto (MIRANDA; TIBÚRCIO, 1999, p. 39).

A política de ocultação de cadáveres, com a divulgação de versões falsas pelos órgãos de segurança foi uma constante na década de 1970; época em que a propaganda oficial buscava encobrir as atrocidades cometidas pelos agentes do governo, realizadas na “calada da noite” nos subterrâneos da ditadura militar.

A conquista do Campeonato Mundial de Futebol, em 1970, pela seleção brasileira, foi ostensivamente explorado como propaganda política do governo do Presidente General Emílio Médici. Uma das imagens mais sólidas e duradouras do Presidente Médici é a de torcedor de futebol, rádio de pilha colado no ouvido. É o tempo do ‘Brasil, conte comigo’; do ‘Brasil ame-o ou deixe-o’. A censura cuidava do controle e neutralização das críticas e de evitar notícias negativas. (COUTO,1999, p.115)

O marketing governamental se pautava na explicação do sucesso alcançado pela seleção de futebol e na propaganda de que a economia vivia uma época de crescimento. Era a época do dito “milagre” econômico. Neste contexto o Presidente ditador detinha uma grande popularidade, entre a classe trabalhadora, como relatou oex Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva:A popularidade do Médici no meio da classe trabalhadora era muito grande. Ora, por que? Porque era uma época de pleno emprego. Era uma época do milagre brasileiro eu digo pelo que eu vivia dentro das fábricas. Agora veja: se houvesse eleições e tivesse espaço para a oposição falar obviamente que a popularidade poderia cair muito(SILVA apud COUTO, 1999, p.117).

Neste cenário se desenvolveu um dos momentos mais vigorosos da repressão política. Houve um esfacelamento de uma série de organizações envolvidas em ações armadas. Uma delas foi a VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), vítima de Cabo Anselmo, um dos mais célebres colaboradores da Comunidade de Informações. Ex-membro da Associação de marinheiros do Brasil, infiltrado na VPR, foi responsável pela morte de vários militantes desta organização, dentre eles o potiguar Edson Neves Quaresma, nascido no dia 11 de dezembro de 1939 em Itaú no município de Apodi, assassinado após a delação do Cabo Anselmo.

Segundo Suzana Keniger Lisboa, Anselmo foi agente da ditadura infiltrado nos movimentos sociais o que se confirma no caso do potiguar, pois: Quaresma era na época o contato mais permanente de Anselmo. Voltara de Cuba para criar condições para retorno do ‘amigo’. Ocultar sua morte era questão fundamental para o prosseguimento, com tranquilidade, do trabalho de infiltração. (LISBOA apud MIRANDA; TIBÚRCIO, 1999, p.257)

Edson ingressou na Escola de Aprendizes de Marinheiros, no Recife em 1958. Anos depois, no Rio de Janeiro, começou a militar na defesa dos interesses dos marujos brasileiros. Após o golpe militar entrou na clandestinidade, viajando para Cuba onde fez um treinamento militar, tornando-se militante da VPR. (COSTA, 2000)

O Estado brasileiro reconheceu sua responsabilidade na morte de Edson Quaresma. A Comissão Especial, criada pela Lei nº 9.140 , na sua maioria votou de acordo com o parecer da relatora Suzana KenigerLisbôa: Edson Neves Quaresma foi morto sob a responsabilidade do Estado. Quaresma, depois de ferido, teve sua garganta esmagada. (MIRANDA; TIBÚRCIO, 1999)

Este era o verdadeiro Brasil que estava encoberto pela propaganda oficial, escondido por uma censura que mantinha, uma mordaça nas redações dos meios de comunicação. A partir de 1971, torna-se sistemática a eliminação física de presos políticos. (GORENDER, 1998)

REFERÊNCIAS

COUTO, Ronaldo Costa.  História indiscreta da ditadura e da abertura: Brasil (1964-1985). Rio de Janeiro: Record, 1999.

GORENDER, Jacob. Combate nas trevas. São Paulo: Ática, 1998.

MIRANDA, Nilmário; TIBÚRCIO, Carlos. Dos filhos deste solo: mortos e desaparecidos políticos durante a ditadura militar: a responsabilidade do estado. São Paulo: BOITEMPO: Fundação Perseu Abramo, 1999.