Por Ivenio Hermes
A continuidade do atual modelo de segurança pública pode ser visto como a manutenção das falhas históricas nas quais o Brasil vem se mantendo, salvo pequenos acertos pontuais, onde uma ou outra ideia deu certo, mas por um curto período de tempo.
Constantemente escravizados pela tentação de manter no governo esse ou aquele político eleito para executivo, devido aos acertos alardeados de sua administração, a sociedade vive sendo impedida de buscar mudanças pelo receio de piorar o pouco que se conquistou através de uma política de governo. Mas segurança pública precisa ser desvinculada dessa fórmula de manutenção do poder executivo, e se transformar numa política de Estado.
O professor doutor Geraldo Di Giovanni, do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas (NEPP) da Unicamp, estabelece com maestria a diferença entre os dois tipos de política:
“Em geral, diz-se que as políticas de Estado são aquelas que conseguem ultrapassar os períodos de um governo. A diferença entre aquilo que é política de Estado e o que é política de governo é a maneira como elas são institucionalizadas. Se elas são fortemente institucionalizadas em uma sociedade, não há quem as mude. Não adianta trocar o governo”.
Apenas esclarecendo, as políticas de governo são estabelecidas de forma elementar e visam determinadas medidas que respondam de forma imediata certas demandas, cuja eficácia e duração estão atreladas ao tempo que aquele governo tem para administrar. Destarte, se a sociedade quiser que tais ações continuem acontecendo, precisam manter aquele político ou partido que a vem implementando. Políticas de Estado, contudo, são construídas de forma mais elaborada, passando por discussões que envolvem diversos setores da máquina estatal através de estudos técnicos, simulações, análises, efeitos na economia, no orçamento, e outras, estabelecidas em leis e diretrizes que envolvem a sociedade civil e a vontade popular, de tal forma que a amplitude de suas ações sejam sentidas durante muito tempo e independente de quem esteja ocupando os cargos executivos.
A segurança pública tem sido tratada assim, como política sazonal, que é feita para durar apenas pelo período em que um governante se mantem no governo, tornando-a como atrativo extra para a conquista de votos na corrida eleitoral.
Entretanto, tratar a segurança de um povo dessa forma é no mínimo uma forma leviana de agir, pois a eficácia das ações de segurança precisam ser mensuradas naquilo que a sociedade quer para as próximas gerações e não apenas para os próximos meses.
Ações emergenciais se fazem necessárias aqui e ali, de acordo com as circunstâncias inusitadas que as demande, mas é a sociedade que precisa determinar aquilo que ela quer do Estado enquanto agente promotor de políticas de segurança pública de efeito duradouro.
Na contra mão do desejo da sociedade, o que se tem observado é o desejo de classes querendo adequar a segurança aos seus interesses egoístas e escravizadores. A grande maioria da classe política quer manter os operadores de segurança pública sob seu controle e não permitem que os órgãos de segurança evoluam, porém, classes de operadores de segurança pública desejam apenas uma “evolução” que lhes seja adequada e confortável.
O debate atual, sobre o ciclo completo da atividade policial tem sido desvirtuado por policiais, que desejam arrogar para si as competências que são de outra entidade policial, não porque visem o bem social, mas porque desejam ampliar sua malha de poder, mas quando esses são confrontados sobre a desmilitarização, se sentem de imediato afetados, pelo temor da perda do poder.
Outro debate atualmente em voga tem buscado a aceleração do processo de investigação criminal, que atualmente passa pelo inquérito policial, e ao invés da busca pelas soluções que a sociedade demanda, três classes de policiais se digladiam, porque enquanto uma quer manter um sistema ultrapassado de investigação, que cria um gargalo no processo de solução de crimes, as outras são colocadas como usurpadoras de atribuições.
O controle social da atividade policial precisa ser efetivado, é a população que sente a dor da perda de entes queridos e da depredação de suas propriedades conquistadas com sacrifício, que pode construir o rol de suas necessidades. É necessário que haja um desvio do induzimento de políticos e de classes dominantes, e uma aproximação com os operadores de segurança, para a conquista definitiva dessa proteção da vida, o bem mais caro que é colocado em risco diariamente por causa da ineficácia do atual modelo de segurança pública.
A segurança pública de emergência não pode continuar sendo permanente e os valores morais precisam ser o mote para redirecionar classes e instituições policiais, para o verdadeiro objetivo do operador de segurança pública: a proteção da vida e da propriedade, numa busca por servir à todos os seguimentos da sociedade sem privilegiar uns em detrimento de outros.
Esse é o desafio para a segurança pública atual, deixar a era do improviso, vencer a barreira do mandato político de quatro anos, sair dessa república do improviso e criar uma verdadeira segurança pública que provoque uma mudança substancial no Brasil das futuras gerações.
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REFERÊNCIA:
JOSÉ NOVAES (Rio de Janeiro). Editor (Org.). Psicologia e Políticas Públicas. Jornal do Conselho Regional de Psicologia, Rio de Janeiro, v. 7, n. 27, p.3-6, 14 jul. 2010. Bimestral.
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SOBRE O AUTOR:
Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Colaborador e Associado Pleno do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Integrante do Conselho Editorial e Colunista da Carta Potiguar. Pesquisador nas áreas de Criminologia, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial.
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HERMES, Ivenio. República do Improviso: A Permanente Segurança Pública de Emergência. Disponível em: < http://j.mp/LuLD3Z >. Publicado em: 31 jan. 2014.