Desperdício do Erário Público e Desvalorização de Policiais e Concursados
Por Ivenio Hermes
Retrospectiva
Em 2008 o governo abriu edital de seleção para preenchimento de 438 vagas para Polícia Civil do RN, sendo 68 (16%) para delegados, 263 (60%) para agentes e 107 (24%) para escrivães. Somente no final de 2010 foi concluído o curso de formação 5° e última etapa com 514 policiais formados, sendo a primeira convocação apenas no último dia do ano de 2011.
Desde então, as nomeações continuaram sendo fracionadas. Cada edição apresentava um pequeno número que não causava sensível diferença, a não ser pelos valores individuais, e atualmente, cinco anos depois do edital e três anos após o curso de formação, 8 portarias de nomeação foram publicadas, sempre preterindo as vagas do concurso, pois eram baseadas nas vacâncias deixadas por aposentados e falecidos, e algumas vezes também um punhado de exonerados, não criando uma oxigenação suficiente ao plantel de policiais da PCRN.
*(Vermelho) Elias de Souza Silva (PNE) nomeado na primeira portaria.
*(Azul) Desconsiderando a licença concedida por três anos a APC R.B.M.C.
A demora nas convocações, somado à falta do cumprimento da promessa da Governadora Rosalba Ciarlini em realizar nomeações mensais, que aliás, foi um dos principais debates durante as negociações para o encerramento da greve que durou 65 dias, provocou outro problema, a evasão dos concursados. Essa grande evasão que impacta em desperdício do dinheiro público que foi gasto no treinamento, retira a expectativa de melhoras no segmento investigativo da segurança pública e destarte, sustenta a criminalidade local e atrai os criminosos de fora pelo elevado índice de impunidade, afinal de contas, pouco adianta os esforços da polícia ostensiva e até da própria polícia judiciária em realizar detenções, prisões e diversas operações, que somente ajudam a lotar os estabelecimentos prisionais, haja vista que desembocam no represamento da capacidade investigativa da polícia judiciária.
Desistências em Todos os Cargos
Através desse desgaste, a segurança pública agoniza e a Polícia Civil sofre severas baixas. Em todos os cargos há um descontentamento generalizado com a desvalorização oferecida pelo Governo do RN, mais evidenciado pela falta de armamentos, viaturas específicas para o serviço de investigação e viaturas ostensivas com todos os equipamentos funcionando, falta de locais adequados de trabalho e de atendimento ao público, retratado em delegacias em estado deplorável de conservação, sendo que para a reforma e reaparelhamento de delegacias havia uma verba de 2 milhões que foi devolvida pela ausência de cuidados com a coisa pública, como já foi amplamente descrito no artigo Torrentes de Insegurança: Sobre a Gestão Pública, o Princípio da Eficiência e o da Publicidade no RN.
Os concursados que veem suas expectativas sendo frustradas, recomeçam sua busca de outras oportunidades de trabalho que são encontradas na iniciativa privada e em outros concursos públicos mais sérios, como foi o caso do promotor de justiça Leonardo Cartaxo, aprovado para o cargo de delegado, e que hoje pertence ao Ministério Público do Estado, ocupando com muita responsabilidade a chefia do Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial (Nucap).
Os extremos dessa situação variam. As 68 vagas ofertadas para o cargo de delegado, já na época do concurso, não eram suficientes, tendo portanto sido formados 84, mas somente nomeados 58, sendo que 13 nem chegaram a tomar posse e 5 pediram exoneração devido às melhores condições de trabalho em outros locais, isto é, 18 vagas não preenchidas.
O problema se repete em todos cargos que seriam preenchidos na PCRN, e através de um estudo, que aliás poderia ter sido providenciado pela própria SESED – Secretaria Estadual de Segurança Pública, pode ser feito um prognóstico através de uma análise simples de quantos candidatos ainda terão interesse nas futuras nomeações.
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Delegados
Como podemos ver no quadro acima, das 26 vagas restantes, pelo menos 7 (sete) não terão mais interesse na PCRN, como por exemplo os dois que agora são juízes em outros estados.
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Agentes
O caso do cargo para agentes, somente 123 foram efetivados, e dos 134 que faltam ser nomeados, já podemos prever que há grandes possibilidades de 24 não terem mais interesse, pois hoje ocupam cargos na Polícia Rodoviária Federal, nos Tribunais de Justiça de outros estados e até mesmo na Polícia Civil de outros estados como o Ceará.
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Escrivães
Dos 56 nomeados para o cargo de escrivão apenas 24 foi efetivado, isto é, menos de 50%, e nas próximas nomeações teremos dois que provavelmente não assumirão na PCRN, pois já estão nomeados para outros cargos em outras unidades da federação.
Desde que o Governo do RN passou a atribuir a incapacidade de nomear à Lei de Responsabilidade Fiscal e mais recentemente ao Tribunal de Contas do Estado, nenhum estudo de relevância foi realizado para demonstrar a necessidade do ingresso desses servidores policiais, apresentando às instâncias superiores a realidade da segurança pública caótica do Rio Grande do Norte.
A Tendência de Desistência
Na contramão da necessidade de um enfoque mais substancial em políticas de segurança pública que visem a atividade investigativa, demonstrado pelo índice de solução de casos inferior a 5% no Rio Grande do Norte, o Governo do RN desperdiça a verba que compõe o conjunto dos recursos econômicos e financeiros do Estado e ainda devolve recursos fundamentais oriundo do Governo Federal.
Esse desrespeito ao direito dos concursados desmotiva e causa um elevado índice de desistências.
Para o cargo de escrivão se observa o maior índice: são 57% de desistentes, seguido de perto pelos cargos de delegado com 31% e depois o de agente com 29% de desistências, perfazendo um índice geral de 35%, em outras palavras, a necessidade da polícia judiciária, aquela responsável por formatar o trabalho que levará um criminoso à justiça, está muito longe de ser suprida.
Em uma última perspectiva, na atual conjuntura onde o Governo do Estado do RN apresenta conjecturas sobre câmeras de monitoramento e ocupação do espaço urbano, porém sem investimento no fator humano das polícias civil e militar, ou seja, no ser humano que interpretará as informações obtidas nas imagens e no que dará segurança para o povo ocupar o espaço que lhe é devido, continuaremos numa grande tendência de desistência de ocupação dos cargos para PCRN.
Essa forma de tratar a segurança somente privilegia a impunidade e a continuação das diversas práticas criminosas no Rio Grande do Norte.
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SOBRE O AUTOR:
Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Colaborador e Associado Pleno do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Integrante do Conselho Editorial e Colunista da Carta Potiguar. Pesquisador nas áreas de Criminologia, Direitos Humanos, Violência, Direito e Ensino Policial.
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HERMES, Ivenio. Análise das Desistências no Concurso PCRN (Parte 1 de 2): Desperdício do Erário Público e Desvalorização de Policiais e Concursados. Disponível em: < http://j.mp/1bn9QPT >. Publicado em: 04 jan. 2014.