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Nem Sempre se Pode Ser Deus

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Sobre a coragem de José Gurgel Pinto, o Dom da Ubiquidade dos Direitos Humanos e o Complexo de Messias

Por Ivenio Hermes

God by Kienzan(Publicado originalmente no Jornal De Fato/Coluna Retratos do Oeste)

A inversão de valores na qual nossa sociedade tem mergulhado parece estar presente em todas a áreas. Profissionais, religiosos, políticos e outros segmentos vivem pregando a paz, a harmonia, a cooperação e outros valores que eles mesmos violam em nome de seu próprio egoísmo, distanciando-se daquilo que pregam. Essa dissociação do pregar e do agir está cada vez mais distante da real promoção de valores morais.

Quando os valores de um homem fazem parte da essência de seu ser são poucos os que reconhecem, a grande maioria só percebe aquilo que é amplamente divulgado, mas geralmente quem vive praticando o bem não vive propagandeando seus feitos, e quem faz muita propaganda, não pratica o bem de forma legítima, pois possui um interesse egoísta oculto,

José Gurgel Pinto não alardeou sua bravura e seu companheirismo, pelo contrário, em uma atitude abnegada saiu de casa em sua folga, seu merecido descanso, para ajudar seus colegas de profissão no combate ao um crime que estava em andamento, com troca de tiros e perigos evidentes. Sua ação não seria imitada por muitos e nem tampouco mereceu uma nota na imprensa por parte do Governo do Estado que estava ocupado fazendo entrega de viaturas que logo se acabarão por falta de manutenção e que não terão condições de trabalho por causa do contingenciamento de combustíveis.

Ocorre que Gurgel, foi atingido por disparos de fuzil e caiu ferido no cenário de guerra do qual escolheu ser ator voluntariamente, pois nada significaria no salário dele no final do mês, e eis que sua atitude agora se evidencia justamente pela falta de socorro adequado, de material cirúrgico para os cuidados que ele precisava, sem o atendimento que o policial, assim como todos os outros cidadãos merecem, justamente pela falta de gestão do mesmo governo que estava entregando viaturas e prometendo “pagar” diárias e férias atrasadas.

O desgoverno que impera no Rio Grande do Norte também vem sendo combatido há anos. Enquanto muitos ainda se enamoravam das promessas da Administração Ciarlini, promessas de melhorias em todas as áreas, inclusive na segurança pública, foram pessoas ligadas aos Direitos Humanos que primeiro gritaram alto pelo direito dos policiais a terem melhores condições salariais e de trabalho, a terem seu efetivo renovado, a receberem melhores treinamentos que os capacitassem à prestação de um serviço melhor. Uma atitude corajosa de desafiar um governo mandatário e falacioso, que promove propaganda para ocultar os erros que comete e que divulga informações pinçadas para mascarar sua incapacidade de gerir, correta e satisfatoriamente, setores básicos como a saúde, a educação e a segurança pública.

O dom da ubiquidade dos Direitos Humanos não existe, mas seus militante são cobrados vorazmente pelos defensores segmentados de um ou outro grupo. Os “Direitos Humanos”, como costumam ser generalizados os militantes, não são capazes de estar em todos os lugares ao mesmo tempo. O militante é um ser humano que defende algo de forma ativa ou convicta, utilizando recursos próprios para realizar suas atividades.

Assim como a coragem de José Gurgel Pinto talvez nunca fosse reconhecida se não fosse o ferimento que o levou ao destaque midiático, a maioria das atividades dos direitos humanos não são divulgadas, pois não vendem manchetes de jornais.

Será que alguém recorda de Marcos Dionisio Medeiros Caldas, presidente do Conselho Estadual de Segurança Pública, agindo como mediador, pondo em risco sua própria vida, num caso de sequestro? Será que alguém sabe que o custo com ligações telefônicas e combustível gasto para estar em diversos eventos, nos quais os direitos dos policiais são defendidos, são oriundos dos próprios bolsos dos militantes.

E quando há uma ação dos direitos humanos que receba qualquer mérito elogioso, sempre surge os mesmos “falsos defensores dos policiais” dizendo que eles chegaram tarde, que são papagaios de pirata, que estão se aproveitando da ocasião para ganhar evidência. Uma atitude segmentadora e violadora do direito das minorias, nas quais os próprios direitos humanos estão inseridos.

Policial José Gurgel Pinto
Policial José Gurgel Pinto

A coragem de José Gurgel Pinto merece uma condecoração por bravura, e talvez até venha a receber agora que a situação recebeu o apoio da comoção popular, e no dia em que ele receber a medalha, estarão lá os mesmos que não fizeram nada por ele. Yvis Serra, o médico que realizou a cirurgia usando seu material pessoal, e os militantes dos direitos humanos: Catarina Vitorino, Amanda Cristina e o jornalista Cézar Alves, não deverão ser convidados para a cerimônia que evidenciará mais uma conotação política do que o reconhecimento a ser prestado ao policial.

Nem Gurgel e nem os militantes dos direitos humanos possuem o dom da ubiquidade, e nem tampouco possuem Complexo de Messias, querendo aparentar serem os salvadores de algum grupo e de um campo de atuação específico. Os afligidos pelo tal complexo se exaltam e glorificam seus próprios atos, sendo detentores da verdade e das soluções para tudo, entretanto, revelam-se meros buscadores de reconhecimento na forma de cargos políticos, de recompensas financeiras ou de ostentação de poder.

Nem sempre se pode ser Deus, nem sempre se pode ser Deus, por isso que estou gritando, por isso que estou gritando, por isso que estou gritando, por isso que estou gritando! (Titãs, música Nem Sempre Se Pode Ser Deus)

Sem conhecimento de causa, sem entenderem o verdadeiro aspecto da atividade policial e dos direitos humanos, algumas pessoas dissociam essas atividades influenciadas pela mídia pragmática que promove um falso senso comum, e dessa forma, essas pessoas praticam atos de violência verbal e visual divulgando falsas afirmações sobre os dois grupos.

A atitude de generalizar é cruel e desmotivadora. Quem demanda que policiais e direitos humanos estejam em todos os lugares, que tenham a capacidade de ser onipresentes e oniscientes, julgam e condenam como se fossem Deus, mas em uma ou outra ocasião, sem que nem percebam, estão sendo defendidas pelos mesmos que elas tanto condenam, e quando essa necessidade se tornar perceptível, elas perceberão que nem sempre se pode ser Deus.

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SOBRE O AUTOR:

Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Conselheiro Editorial e Colunista da Carta Potiguar. Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.