Empurrando o Crime com a Barriga
Por Ivenio Hermes
Depois de mais de um ano da publicação do artigo Falta de Heróis na Segurança Pública onde abordei o assunto das Unidades de Polícia Pacificadora no Rio de Janeiro e seu método de “varrer a sujeira para baixo do tapete” para que o turista passe por cima sem ver as mazelas da capital carioca, retomo o assunto para reiterar a malfazeja ação.
(Publicado originalmente no Jornal De Fato/Coluna Retratos do Oeste)
O resultado positivo das UPPs é sentido por poucos, dentre eles Sérgio Cabral, o principal beneficiado, que graças à toda propaganda gerada em cima de sua política salvadora da pátria se reelegeu para continuar governando o Estado. Mas as famílias de policiais que desenvolveram problemas de saúde, pela falta de acompanhamento de suas atividades de alto risco e os próprios policiais não sentem, e nem tampouco as famílias de desaparecidos durante as ações e que nem sequer foram parar nas estatísticas oficiais, além, do óbvio caso Amarildo, cujo desaparecimento e posterior constatação de tortura seguida de morte, levou 25 policiais militares da UPP da Rocinha a serem indiciados, mobilizando segmentos da sociedade para formar um conceito generalizado de polícia que macula o trabalho de bons policiais em razão das atividades ilegais de outros.
Mas esse problema da política de segurança pública do Rio vai mais adiante. Para atender a demanda do “Projeto UPP” que necessita de um verdadeiro exército para ser implantado, policiais foram praticamente “fabricados” e não formados, numa pressa absurda que não buscou nos direitos humanos (e estou falando do direito dos policiais) e nem na boa doutrina de capacitação, a nova polícia que a sociedade precisa.
As condições de má formação profissional desses policiais retorna em forma de uma violência contra inocentes, na abordagem “não pacificadora” de cidadãos que são presumidos culpados e recebendo um tratamento questionável.
Não se pode fornecer treinamentos apressados para pessoas que exercerão uma atividade de suma responsabilidade e de alto risco. Sem preparo para esse tipo de trabalho, esses homens e mulheres se tornam potenciais vítimas e vitimizadores, que agem em nome da covardia do Estado em não investir em programas constantes de capacitação e avaliações de desempenho e comportamento na profissão.
As Unidades Pacificadoras de Polícia não foram exitosas em promover o policiamento de alta interação com as comunidades, e nesse ponto houve uma ingenuidade em acreditar que os chefões do crime organizado não se adaptariam à nova regra. E foi assim que traficantes não fichados, se tornaram pseudo trabalhadores, de carteira assinada e tudo, para poderem transitar entre os policiais sem despertar suspeita, enquanto eles estavam voltados para pessoas como o coitado do Amarildo e de sua família. E o pior é que a velha prática de desfilar com armamento pesado numa demonstração de poder evoluiu para ações veladas e mais requintadas.
Quem não se adaptou, precisou fugir. E concordo com AZEVEDO (2013), da Veja, quando ele afirma que:
“Nas áreas em que há UPP (umas 40, acho; há perto de 1.300 “comunidades”), a segurança, com efeito, melhorou. Até porque o narcotráfico passou a colaborar. Mais: com os policiais lá, acaba a guerra de facções, e as milícias deixam de importunar. É o céu.”
E como já é quase de conhecimento de geral, o crime migra para os locais onde seus perpetradores tenham mais chance de impunidade. Enquanto comandantes do narcotráfico agem sigilosamente, outra parte se deslocou para as cidades vizinhas, cujos prefeitos reclamam que os criminosos das favelas “pacificadas” agora são seus residentes.
Portanto, a “pacificação” só existiu na Zona Sul da capital, onde os turistas precisam continuar enxergando que o “Rio de Janeiro continua lindo”, mas nas doze cidades que compões a Baixada Fluminense nas cidades de Niterói e São Gonçalo, além da Região dos Lagos, agora superabunda a ação criminosa, e às vésperas de novas eleições, novas ações tapa-buracos serão iniciadas em algumas áreas que emergem em evidência, de acordo com os conchavos políticos, não para promover a segurança pública, mas sim para garantir as próximas eleições.
A falha das UPPs não está no seu projeto em si, mas na forma e finalidade com que são usadas e se o crime migra é porque a ação de ocupar as comunidades sem prender os criminosos os enxota para outros lugares.
Logo, logo esses criminosos em fuga iniciarão suas atividades em locais onde os gestores levarão meses para admitirem suas presenças, e sem perceberem as consequências naturais da migração do crime, provavelmente acharão adequado usar o mesmo método de Sérgio Cabral, empurrando o crime com a barriga e só percebendo o erro quando já for tarde demais.
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REFERÊNCIA:
AZEVEDO, Reinaldo. UPPs e mistificações. Finalmente, a verdade: bandido solto faz… bandidagem! Revista Veja. Disponível em: < https://db.tt/OSUfsvs4 >. Publicado em: 07 nov. 2013.
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SOBRE O AUTOR:
Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Conselheiro Editorial e Colunista da Carta Potiguar. Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.