Por Ivenio Hermes
Embora a Lei Maria da Penha tenha sido um avanço no combate aos crimes cometidos contra as mulheres, recente pesquisa divulgou sua ineficácia em reduzir os crimes de homicídio contra mulheres. Além disso, a inoperância do poder judiciário e dos organismos de segurança pública continuam cooperando para que o feminicídio continue sendo uma prática impune no Brasil.
(Publicado originalmente no Jornal De Fato, Coluna Retratos do Oeste)
Nesse clima de guerra contra a impunidade que está sendo demandado em todo país, as minorias são muito lembrada quando são vitimizadas pelas chacinas, pela atuação dos grupos de extermínio ou quando são pessoas de interesse. No caso das mulheres, a maioria das vítimas não está inserida nesses grupos, sendo somente colocadas em evidência numa investigação quando o crime causa comoção pública. Esse é o caso da pedagoga Andréa Aderaldo Jucá.
Andréa Aderaldo Jucá foi assassinada com 20 facadas pelo ex-suplente de vereador e ex-marido Alan Terceiro, dia 13 de outubro último, e os detalhes que vazaram para a imprensa demonstram uma história de desídia no serviço policial.
Após inúmeras ligações de vizinhos, cujos registros do CIOPS (Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança) mostram vizinhos desesperados com os gritos da vítima quando ainda estava sendo espancada e pedia socorro, mas as radiopatrulhas acionadas não atenderam aos chamados até que fosse tarde demais.
Existe uma heterogeneidade de situações nas diversas unidades da federação, e o Alagoas é o primeiro colocado entre os estados do nordeste. O Rio Grande do Norte ocupa a 5ª colocação e o Ceará a 7ª nesse ranking de violência em que o Brasil possui o número total de 4.465 homicídios.
Tabela extraída do Mapa da Violência 2012
Assim como a falta de interesse das polícias, que usam o senso comum determinado pelo ditado popular “briga de marido e mulher ninguém mete a colher”, a mesma coisa acontece em algumas persecuções penais que se arrastam pelos anos, tendo suas provas corroídas e desgastadas pelo tempo, tornando potencialmente impossível levar o criminoso à justiça. E pelo Brasil afora se observa crimes de feminicídio sendo punidos com pagamento de cestas básicas, indignando e revoltando amigos e familiares das vítimas, como o caso da estudante Silvana Amélia de Souza Duarte, de Mossoró, que tinha 18 anos quando foi morta e seu assassino, mesmo condenado, não ficou sequer um dia na prisão e nem perdeu o cargo público que ocupa até hoje.
O machismo, a intolerância, o desprezo dos órgãos de polícia, tanto ostensiva quanto investigativa, a falta de efetividade e celeridade nas ações punitivas, são as principais culpadas pela impunidade nos feminicídios. Se um caso emblemático como esse que aconteceu na capital cearense, imagine se fosse no interior, onde nem registros eficazes de violência contra a mulher são feitos?
A vulnerabilidade feminina é alarmante e promovida pela incapacidade do Estado em determinar e punir criminosos.
As mulheres, como a “maioria da minorias”, estão sujeitas a toda espécie de violência. Maridos e amantes abusadores, agressores, violentadores, estupradores e outros, praticam diariamente crimes que não chegam sequer aos registros policiais, aumentando sua autoconfiança para continuarem agindo tranquilamente, até que, sem os limites que deveriam ter sido impostos, eles passam para o próximo degrau de sua ação criminosa: o feminicídio.
Não precisamos de mais leis se as que temos não são aplicadas com a velocidade e o rigor necessário, nem precisamos de policiais sem condições de atendimento às ocorrências, seja por falta de equipamento e matéria, seja por falta de número de efetivo ou de treinamento adequado para atender essas situações.
O que a sociedade brasileira precisa é de políticas eficientes de educação que orientem as mulheres nos mais distantes rincões desse país continental, de mudanças basilares na forma de pensar de agentes encarregados de aplicar a lei e de representantes do judiciário. Se uma mudança contundente no processo de formação através da educação e do treinamento policia não ocorrer, a sociedade brasileira continuará criando novas leis e fornecendo equipamentos para pessoas que não sabem como agir.
O feminicídio, assim como outros crimes contra as minorias, ainda não caiu de moda e continua envergonhando o Brasil, quem dera envergonhasse aqueles cuja conduta omissiva e comissiva promove a continuidade dessa prática criminosa.
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SOBRE O AUTOR:
Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró, Conselheiro Editorial e Colunista da Carta Potiguar, Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Publicado em parceria com Cezar Alves, Jornalista graduado em Comunicação Social, tendo atuado como fotojornalista e editor da página policial no Jornal Gazeta do Oeste, atualmente colabora com a edição do Caderno de Estado do Jornal de Fato e da Coluna Retratos do Oeste, é militante na busca por soluções sociais, com ênfase na segurança pública.
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REFERÊNCIA:
WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência 2012: Atualização: Homicídios de Mulheres no Brasil. São Paulo (sp): FLACSO Brasil, 2012. 27 p. (CEBELA: Centro Brasileiro de Estudos Latino-americanos).