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Nota de repúdio contra as violências sofridas pela população em situação de rua do Rio Grande do Norte

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O Centro de Referência em Direitos Humanos da UFRN (CRDH/UFRN) e o Conselho Estadual de Direitos Humanos e Cidadania (COEDHUCI) vêm publicamente manifestar sua indignação e repúdio diante das violências cometidas contra pessoas em situação de rua no estado do Rio Grande do Norte. Em breve levantamento realizado através de consulta aos veículos da mídia local foram contabilizados oito homicídios e inúmeras agressões e tentativas de homicídio contra essa população. Tal quantitativo refere-se apenas ao primeiro semestre de 2013, e ainda assim, limita-se aos casos divulgados pela imprensa, mas infelizmente, tais números devem ser superiores. Desde 2012, pelo menos, 21 moradores de rua foram assassinados.

images (14)Duas pessoas foram alvejadas enquanto dormiam em um ponto comercial em Macaíba, enquanto na Ribeira dois moradores de rua conversavam quando um homem parou em uma motocicleta e disparou vários tiros. Em um caso mais recente, ocorrido na Zona Sul da capital, um homem dormia ao lado de um ponto comercial quando atearam fogo em seu corpo, queimando 90% dele. Esse tipo de violência nos deixa vigilantes e preocupados com a vulnerabilidade de aproximadamente 2.200 pessoas que vivem em situação de rua na capital do RN, a crueldade como essas mortes acontecem nos levam a pensar que o motivador é, de fato, a promoção da limpeza social.

As pessoas que vivem em situação de rua sofrem diariamente as consequências de um sistema opressor, que necessita de um exército de miseráveis para se manter, um sistema que reproduz a lógica do individualismo e da culpabilização dos sujeitos pelas suas condições degradantes de vida. Esses sujeitos, em uma luta constante pela sobrevivência, são violados em seus direitos mais básicos, o que dificulta, e muitas vezes impede que eles busquem estratégias de resistência, afinal como bem lembra Marx (1883) “o homem precisa, em primeiro lugar, comer, beber, ter um teto e vestir-se antes de poder fazer política, ciência, arte, religião, etc”.

Esse cenário de violência, e porque não dizer, de extermínio das pessoas em situação de rua, que vem acontecendo em vários estados do país, nos leva aqui a relembrar o triste massacre que ocorreu em 2004 na Praça da Sé em São Paulo, onde oito pessoas em situação de rua foram mortas com golpes na cabeça e seis ficaram feridas. A partir desse lamentável episódio, que deixou como marco o dia 19 de agosto como o dia da luta da população em situação de rua, o Estado vem sendo pressionado pelo Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR) a manter outro tipo de relação, que não a repressão e violência cometida pelos seus agentes, e a se aproximar das pessoas que utilizam a rua como espaço de moradia e sobrevivência.

Porém, a instituição, em 2009 da Política Nacional para População em Situação de Rua, como resposta apresentada pelo Estado às pressões e luta do MNPR, articulado e fortalecido no contexto do Massacre, apesar de ter sido uma importante conquista, vem se deparando com a omissão histórica promovida contra os “descartáveis urbanos”. Tal omissão naturaliza esse cenário de violência e opressão, e por mais que o Movimento grite “Não queremos apenas Sopa e cobertor!”, a invisibilidade persiste, inclusive na hora da morte, em que sequer o inquérito de investigação é instaurado por se tratar de pessoas sem referência familiar. Nesse sentido, faz-se fundamental dar voz ao poeta Carlos Eduardo (Morador de Rua em Salvador) quando ele exclama para a sociedade “Não somos lixo. Não somos lixo e nem bicho. Somos humanos (…) Não somos profanos, somos humanos. Somos filósofos que escrevem suas memórias nos universos diversos urbanos. A selva capitalista joga seus Chacais sobre nós. Não somos bicho nem lixo, temos voz. Por dentro da caótica selva, somos vistos como fantasmas. Existem aqueles que se assustam. Não somos mortos, estamos vivos (…)”.

Motivados pelas palavras do poeta deixamos aqui a nossa indignação diante da violência impune que assola a população em situação de rua do Rio Grande do Norte, e convocamos a população de rua e toda a sociedade potiguar para pensarmos juntos em ações de luta na defesa intransigente dos direitos humanos da população em situação de rua.

O CRDH/UFRN e o COEDUCI estarão acompanhando diretamente as ações junto à Secretaria de Segurança do RN sobre os casos de violência contra pessoas em situação de rua, exercendo a fiscalização, denunciando junto ao Ministério Público e o Poder Judiciário. Assim como, continuará prestando assessoria ao Movimento da População em Situação de Rua para o seu fortalecimento no cenário Potiguar.