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A representação da realidade na sociedade dos simulacros

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Dentre inúmeros fenômenos relativos às relações de poder, na nossa sociedade, a serem observados e investigados, tem nos chamado muita atenção as representações dos signos do poder no cotidiano. Os hábitos diários, num campo fértil de observação, muito tem nos oferecido sobre a representação dos papéis sociais mais glorificados pela ética do capital.
Em nosso processo de construção de identidade e de maturação psicossocial, intuitivamente, fazemos uma leitura bastante particular dos signos de poder que prevalecem na prática cotidiana. Internalizamos os valores conforme as particularidades de nosso contexto; entendendo naturalmente, diante do estabelecido, o que será bem aceito, estimulado e o que será desconsiderado e repudiado.

Os mecanismos psicossociais a que estamos submetidos estão impregnados de estratégias massificadoras que negam permanentemente a subjetividade e a singularidade dos indivíduos em formação. Somos estimulados a dissociar o nosso sentir do nosso pensar, deixando muito de lado o que vem de nossa percepção interna em nome do que nos é exigido e aceito socialmente.

A tendência é que, no percurso de nosso desenvolvimento psicossocial, se estabeleça uma confusão interna e angústia, pelo falta de não atendermos nossa singularidade. A consequência de quem cresce e vive em função dos hábitos massificados estabelecidos é uma comprometedora fragilidade interna. Vale observar pessoas muito artificiais, que parecem não ter nada de sólido em seu eu intrapsíquico.

A criação do falso self (termo muito utilizado pela psicanálise freudiana) faz com que as pessoas, para “sobreviver”, precisem vivenciar (inconscientemente) um personagem que corresponda aos olhares do outro, para ser bem aceito e valorizado.

O altíssimo preço de dissociação do eu e o abandono dos desejos internos resultam na cristalização de uma pobreza subjetiva que faz com que se crie uma percepção muito distorcida de si mesmo (narcisista ou depressiva, por exemplo).
Na falta, quase que absoluta, de assertividade, estas pessoas tendem a se render, como presas fáceis aos apelos massificadores de toda espécie, principalmente, aos de serem pessoas de “sucesso”, de “prestígio” e “poderosas”, mesmo que internamente estes não sejam seus verdadeiros desejos.

Estes serão os que, no cotidiano, mais representam a realidade, pois em nossa sociedade de simulacros e simulações (título de livro de Jean Baudrillard), a representação da realidade vale mais que a própria realidade.
Para ser mais objetivo: o famoso médico não precisa ser exatamente um excelente médico, mas apenas APARENTAR\REPRESENTAR ser um bom médico para continuar a ser glorificado e cortejado pelas hierarquias sociais, mesmo que concretamente seja apenas um médico simplório, sem diferenciais e sem paixão pela profissão.
Quando nos aproximamos de algum “poderoso” (chefe, gerente, o “doutor”, advogado, o diplomado, famoso, político, etc) que nos é imposto como exemplo a ser seguido, percebemos que, concretamente, em suas práticas e hábitos, estes não correspondem à fama que tem. Muitas vezes, esses medíocres “profissionais” apenas exercem um “personagem” em seus ofícios bem aceitos e glorificados pela sociedade das aparências e do capital.

Nós fingimos não perceber e silenciamos, num curioso pacto de hipocrisia e cegueira coletiva, diante das representações construídas por poderosos discursos que alimentam a mitificação de determinados papéis sociais.
Somos estimulados a sermos farsantes em toda nossa a formação. Observemos os universitários que apenas aparentam ser “bons” estudantes (principalmente cursos mais glorificados, de mais status !!!), mas na verdade não querem se esforçar e estudar realmente.

Querem o máximo de facilidade para conseguir o diploma…Lembremos inclusive destes mesmos que são capazes de comprar monografia ou tcc!!! Para assim irem ao mercado de trabalho e dar segmento às farsas e representações que compõe nossa sociedade.

As exceções existem, pagam preço alto, não fazendo concessões as representações de aparências e do discurso de segurança. São exatamente aqueles que fazem escolhas que realmente correspondam aos seus desejos internos, enfrentando obstáculos (de forma marginal e criativa!) e deixando prevalecer uma desafiante coerência e o que vem do coração.

Os que vivem de representações diárias e de artificialidade interna são incapazes de sentir a vida pulsar ou a alegria genuína. Quase que impotentes afetivos diante da ousadia e criatividade, seres esvaziados que jamais experimentaram a sensação ímpar de integração humana e inteireza.

Ao leitor, peço que observe ao redor e tire suas próprias conclusões. Viva a marginalidade criativa!!