Search
Close this search box.

Em defesa do Carnatal

Compartilhar conteúdo:

Por Flávio Mottinha,

O Rio Grande do Norte sofre com a ausência de identidade cultural. Mas, quando vejo o Carnatal e observo o resgate histórico que faz fico boquiaberto com tamanhas referências a um dos nossos momentos mais importantes do passado: o ciclo do gado.

Podemos afirmar, inclusive, que a trajetória do povo potiguar é dividida em antes e após a pecuária ter sido o primeiro elemento de sólida sustentação econômica. Foi uma época de conflito entre colonos e nativos, desbravamento da capitania e, com a consolidação da pecuária no interior, de charqueadas (salgavam a carne e secavam ao ar livre – fabricação da carne de charque ou carne seca).

A condução da boiada até as áreas de abate eram realizadas pelos vaqueiros. A estratégia era organizada: vaqueiros munidos de berrantes e/ou aboiadores (aboio é o canto monótono e triste destinado a boiada com o fim de reuni-los e guiá-los) com os tangerinos que garantem as extremidades da boiada. Imagino, nessa época, o território norte-riograndense sendo rasgado, do Seridó (área de maior relevância da pecuária potiguar) ao Oeste (local que se destacava pela produção de sal), pelas patas dos animais. É, justamente, essa procissão de animais que o Carnatal remonta. As referências são inequívocas, vejamos:

1. Os vaqueiros e aboiadores são os cantores. Hoje, não usam mais berrantes, mas trios elétricos (berrantes elétricos?) para que os foliões (boiada) sejam conduzidos.

2. Para que os foliões/boiada não dispersem pelo caminho os cordeiros (indivíduos que, munidos de corda, demarcam os limites do bloco) fazem a função dos tangerinos.

3. O rastro de excreta (urina e fezes) deixada ao longo do trajeto sofreu pouca alteração, talvez um pouco menos de fezes e mais urina.

4. O destino, também, continuou o mesmo. Afinal, homens e mulheres manifestam seu comportamento bovino (bois e vacas) através de uma sede concupiscente (desejo carnal) insaciável, o que me leva a crer como destino inevitável: o “abate”.

Assim, não tenho como deixar de defender o Carnatal como uma expressão que remonta um dos momentos mais importantes da história do Rio Grande Norte. É a contemporanização do ciclo do gado.

Viva o século XVIII em pleno século XXI!