“Alguns cientistas acreditam que hidrogênio, por ser tão abundante, é o elemento básico do universo. Eu questiono este pensamento. Existe mais estupidez do que hidrogênio. Estupidez é o elemento básico do universo.”
Frank Zappa
Este título não soa tão bem quanto o da obra de Pierre Lévy e também não tem a plástica e a chiqueza dos usados por outros teóricos europeus da comunicação contemporânea – da França ao Chipre – para nomearem seus livros. Ué, peraí, mas o Chipre fica na Europa? Tanto faz, estamos no fabuloso mundo da Internet Sauvignon, e aqui tudo é possível, como varrer o bom senso para debaixo do tapete e descobrir que a estupidez é bastante plural! A grande rede se encaminha para a consolidação de um universo paralelo e oligofrênico. Será passagem só de ida?
Quem já se aventurou no conflituoso mundo dos comentários de internet, seja nas redes sociais ou nos portais mais movimentados, já deve ter se dado conta da idiotia que impera nestas seções. São ambientes mais hostis que a Faixa de Gaza. Disparates, histeria, ameaças, fanatismo religioso e todo tipo de opinião burra e odiosa publicada sem a menor vênia ou moderação em um mural bizarro. Tudo isso possível graças ao anonimato, a covardia e o livre-arbítrio que a internet oferece. O Ministério da Saúde deveria advertir sobre os males da exposição prolongada a esses comentários.
Um dos sintomas (ou seria a causa?) de que a grande rede vai mal é o fato de que as pessoas não gostam de ler textos grandes. Menos no Brasil. Aqui as pessoas parecem não gostar de ler texto algum. Como regra geral o texto de internet tem que ser curto sob a pena de ser relegado ao limbo e ao despeito generalizado. Sem solução para isso, inventaram o Twitter e a consolidação dos 140 caracteres. Não é preciso caminhar muito para ver pessoas discutindo uma manchete e ignorando totalmente a matéria, por exemplo. É a instituição da preguiça digital!
Mas se falta tempo para se prestar a algo útil na grande rede, sobra bastante para as inutilidades que pipocam a todo instante. Basta ver o tipo de humor primitivo que faz sucesso; os vídeos idiotas mais assistidos do youtube; a forte adesão a “colunas ego” e suas fofocas ineptas; o compartilhamento sucessivo e sufocante de amenidades, a necessidade quase vital de polêmicas alimentadas por discursos preconceituosos e a adoração insuperável a animais de estimação. Para tudo isso há tempo, empenho e volúpia!
Apesar de a internet abrigar um acervo quase infinito de bens artísticos em geral, se vê pouca mudança no perfil de consumo desses produtos. A indústria fonográfica, apesar de esgoelar contra a pirataria, mantém forte influência no mundo virtual. Isso explica porque o disco mais pirateado no Brasil é uma obra irrelevante da Rihanna, e não o Paêbiru. Do que reclama a indústria cultural mesmo? Diferente do Rádio e da Tv que possui uma programação fechada, a internet e seus vários caminhos parecem ser subutilizados. Entre outras áreas culturais se vê a mesma coisa, os livros e filmes mais baixados são os da moda, e não exatamente os mais interessantes.
Entre tanta estupidez virtual a maior, provavelmente, é aquela de fundo egoísta. Quando o interesse individual precede o coletivo. Não é raridade presenciar nas redes sociais – e até entre veículos com credibilidade – o compartilhamento de denúncias, correntes, reclamações e informações duvidosas que visam atender interesses privados. Há preguiça enorme aqui também de se verificar rapidamente se aquela baboseira sobre política de fato é verdade. Mas agora não interessa, a informação já foi compartilhada milhares de vezes e continua. Tarde demais, o estrago está feito. Um pouco mais de critério, que tal?
É necessário mencionar também tudo o que há de mais grotesco na rede, como as parafilias, vídeos violentos, os crimes virtuais, a defesa partidária/ideológica cega, a propagação de vírus e outras atividades lúbricas do baixo clero online. Já dizia Henry Miller “Desse mundo que está ai só restará a fedentina”. E talvez alguns HDs danificados. Há quem alerte sobre o discurso utópico de que a internet irá salvar o mundo pelo fato de que ela não tem uma estrutura de suporte à democracia, pelo contrário, ela favorece a criação de grupos cada vez mais fechados e indiferentes ao diálogo. Não curtiu? Bloqueia!
É claro que esse pequeno desabafo não reflete todas as qualidades inerentes à internet e tudo que há de interessante e prático que ela oferece em vários campos do conhecimento. Tampouco tem intenção de generalizar ou cair no lugar comum do “o outro que é alienado”. É importante lembrar que a inclusão digital no mundo ainda é incipiente. E mais importante ainda é lembrar que qualidade do acesso é tão ou mais importante do que a quantidade de acesso. Que as tecnologias sirvam mesmo às inteligências, por que não? Quem sabe assim essa “etapa posterior à expressão oral e escrita” seja um dia sinônimo de liberdade e saúde mental.
P.S.: O Chipre realmente fica na Europa.