Até agora procuro e não encontro o porquê da principal alegação do TRE-RN para aceitar a tese de manipulação de pesquisa, que foi supostamente produzida pelo candidato Carlos Eduardo Alves e apresentada em seu programa eleitoral.
Conforme sentença do juiz José Dantas Paiva, retirada do blog de Dinarte Assunção:
Vê-se que a Representada divulgou a pesquisa utilizando apenas os somatórios dos votos válido, de modo a induzir o eleitor em erro quanto a uma provável realização de segundo turno. Ao veicular tão somente o percentual de votos válidos, a Representada leva o eleitor a concluir que este universo inclui todas as pessoas entrevistadas, isto porque o eleitorado, em sua esmagadora maioria, não compreende conceito de voto válido.
A apresentação do raciocínio do referido juiz é a expressão da necessidade daquilo que já venho falando desde 2008: o TRE-RN tenta regular a publicação de pesquisa sem ter preparo técnico para tanto, ficando a mercê de ilações morais sem qualquer base científica.
Não há nada na legislação, quanto à forma de veiculação de pesquisa em período eleitoral, que fundamente a decisão.
Para ser publicada, uma sondagem deve dizer, conforme 9.504/97:
I – Quem contratou a pesquisa;
II – Valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;
III – Metodologia e período de realização da pesquisa;
IV – Plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução e nível econômico do entrevistado; área física de realização do trabalho, intervalo de confiança e margem de erro;
V – Sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;
VI – Questionário completo aplicado ou a ser aplicado;
VII – Nome de quem pagou pela realização do trabalho;
VIII –Contrato social, estatuto social ou inscrição como empresário que comprove o regular registro da empresa, com a qualificação completa dos responsáveis legais, razão social ou denominação, número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), endereço, número de fac-símile ou endereço de correio eletrônico em que receberão notificações e comunicados da Justiça Eleitoral;
IX – Nome do estatístico responsável pela pesquisa – e o número de seu registro no competente Conselho Regional de Estatística –, que assinará o plano amostral de que trata o inciso IV;
X – Número do registro da empresa responsável pela pesquisa no Conselho Regional de Estatística (Decreto nº 80.404/77).
FUNDAMENTO
Aonde consta que os dados devem ser expostos de maneira integral, ou seguindo a lógica de apresentação dos resultados, conforme o próprio TRE-RN produz no dia 07 de Outubro – votos válidos!?
VERDADEIRA MANIPULAÇÃO
O juiz alega que a pesquisa, na forma como foi publicada, tenta vender a tese do segundo turno. Óbvio. Porém, continuo me perguntando: aonde está a manipulação dos dados!?
Há uma verdadeira manipulação produzida pelo candidato Hermano Morais e por jornais de Natal, que é completamente ignorada. Por que chamo de manipulação? Porque a apresentação da mudança eleitoral é demonstrada sem nenhum âmparo científico.
Por exemplo: duas pesquisas são publicadas por um instituto: a primeira aponta Carlos Eduardo Alves com 44% e Hermano com 19%. A segunda coloca CEA com 42% e Hermano atingindo 21%. Como a pesquisa tem margem de erro de 3%, não há qualquer base técnica para dizer que há alteração do cenário.
No entanto, diz Hermano, corroborado por manchetes de jornal: “CEA cai, Hermano cresce. Segundo turno está mais próximo”.
Há aí, objetivamente, uma manipulação que visa mostrar segundo turno como mais factível, simplesmente porque não existiu qualquer tipo de alteração.
Técnicamente, só é possível falar em oscilação. Seria necessário aplicar uma terceira sondagem para, de fato, fundamentando a segunda sondagem e confirmando o que era apenas uma oscilação dentro da margem de erro, falar em alteração do quadro eleitoral.
IGNORÂNCIA
O juiz, em outro momento, demonstra sua ignorância, no sentido de não conhecer os fundamentos científicos que alicerçam um levantamento.
O magistrado alega que não é possível veicular apenas os votos válidos porque é impossível saber, como a publicação da pesquisa tida como manipulada supostamente tenta intuir, quem de fato irá votar ou não no dia da eleição.
Ora, se toda pesquisa parte do pressuposto de que produz “índices de certeza”, como deixa como pressuposto o representante do TRE, aconselho proibir a veiculação de tudo que é dado de voto eleitoral. Tudo mesmo!
Por que? Porque o dado: x% das pessoas não vão votar (branco, nulos, faltosos) é um número probabilístico, assim como também é probabilístico o número que diz que “Carlos Eduardo tem 42% dos votos”, ou “Hermano tem 21%”. É impossível endossar tais números com 100% de certeza. É uma probabilidade que Hermano goze de 21% da escolha eleitoral, assim como também é uma probabilidade que os votos inválidos, que foram suprimidos por CEA, quando ele apresentou o levantamento apenas com os votos válidos, atinjam índice de 21%. Nessa lógica, é impossível intuir os votos inválidos, mas também os dados exatos de CEA, Hermano, Mineiro, ou qualquer outro candidato. Nessa lógica, se o juiz for fiel ao seu raciocínio e só permitir índices com 100% de certeza, ele só vai autorizar a publicação do resultado da eleição,
ARGUMENTO MORAL
Quanto a dizer que a maioria das pessoas não sabe o que é um “voto válido”, o juiz entra numa questão moral e não mais técnica, uma simples suposição sem qualquer base sociológica, mas que vai de encontro ao princípio democrático.
01) Não sei se a grande maioria das pessoas não sabe o que é um “voto válido”. E em sendo verdade, não sei também se os eleitores são incapazes de articular o pensamento para, de alguma maneira, dá sentido a esse conceito. Na dada situação, a sentença do juiz permanece no terreno da suposição.
02) Mais uma vez vejo a necessidade, se seguir a lógica da sentença do juiz, de proibir a veiculação das sondagens. Ora, se o eleitor não sabe o que é “voto válido”, como alega o magistrado, sabe, então, o que é margem de erro, probabilidade, índice, intervalo de confiança, plano amostral, etc?! Na estranha perspectiva aventada pelo togado, nenhuma pesquisa poderia ser mais publicada porque não há a possibilidade de existir dessiminação do entendimento perfeito acerca do que significa pesquisa eleitoral. A maioria das pessoas não conhece os seus procedimentos.
03) Eu acredito que os eleitores, que podem não saber o que é “voto válido”, em sua acepção técnica, como o juiz pressupõe, ainda assim são capazes e produzem categorias de pensamento para se relacionarem com essa e outras questões eleitorais. Alias, é o sentido da democracia. Do contrário, deveríamos voltar ao passado e impedir que analfabeto vote. E, ao invés de título eleitoral, os mesários deveriam solicitar do eleitor um título de graduação, como já ocorreu no passado. Ou pior, de especialista em pesquisa eleitoral.
TUTELA
A intenção do juiz é positiva. No entanto, sem base técnica, partindo de pressupostos que demonstram total ignorância sobre a base conceitual dos levantamentos, o juiz, em sua sentença, só alimenta preconceitos em relação à veiculação das sondagens eleitorais.
O fato concreto é que, ao tentar proteger a democracia das pesquisas eleitorais, o juiz acaba agindo como gerador de uma tutela, pois que, na prática, diz: ainda que não exista nada na legislação eleitoral e na técnica de pesquisa que impeça a veiculação dos resultados sem os votos inválidos (apenas os votos válidos), da mesma forma como o TRE fará no dia 07 de outubro, eu preciso proteger e selecionar que informação pode ou não chegar a cabeça dos eleitores bobos, facilmente enroláveis.
ELEITOR FLAMENGUISTA
O erro está em acreditar que há o “eleitor flamenguista”, aquele que só vai votar em quem está ganhando. Ora, tal eleitor só existe na cabeça daqueles que atribuem um poder de influência para pesquisa eleitoral, que ela não tem.
Há pouquíssimos eleitores que votam assim, uma grande exceção. E eles recebem um contrabalanço do eleitor contrário, o que vota naquele que está perdendo, o que vota por pena. Sua quantidade também é bem pequena. No final das contas, eles se anulam.
Além disso, os estudos no Brasil mostram que não é o eleitor sem informação o mais influenciado pelo resultado da sondagem, mas justamente o contrário. É o cidadão com competência política, que sabe o que é, por exemplo, voto válido (o que desmonta ainda mais a tese defendida pelo juiz), que usa a pesquisa eleitoral como recurso para gerar, a partir de seu voto, o resultado eleitoral que mais lhe agrada. É o eleitor que pratica voto útil.
Só posso concluir formulando a seguinte pergunta: até quando os TREs vão pautar as suas ações pelo puro achismo? Desconsiderando os ganhos da estatística, da sociologia, ciência política, etc? Até o presente momento não parece existir luz no fim do túnel. O TRE-RN julga com conceitos pré-científicos, puro senso comum.