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Natown, cidade média

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Jota,

me impressiona também o mundaréu de gente que se abriga no guarda chuva que o sobrenome “Cascudo” se metamorfoseou.
Nessa cultura do oficialato local, a própria obra do Câmara Cascudo tende a ser esquecida. Em seu lugar, surgem relatos da grandeza cascudiana, que servem, na maioria dos casos, para que os falantes se legitimem por tabela.
Demonstrando autoridade – sempre meticulosamente construída – no autor que já se transformou no mito fundador da modernidade natalense, o dito cujo acessa cargos mui bem adoçados, recursos públicos e espaços sociais que privilegiam a fala dos “autorizados”.
Veja o caso da Funcarte: diante do fogo cruzado na instituição, que dava conta de ingerência administrativo-política e indícios de corrupção, a prefeita blindou a fundação, dando (colocando) um “Cascudo” na cultura. A situação de caos permanece, mas o escudo cascudiano impede a crítica.
Quanto aos totens do CCHLA-UFRN… minha avó tinha uma boa denominação para aquilo: uma bela “papagaiada”, utilizando a estrutura e recursos do centro, com o objetivo político de angariar apoio para as pretensões carreiristas do diretor, o professor Herculano, que quer ser reitor da UFRN. Mas ao mexer com a guerra de vaidades dos docentes, o tiro do psicólogo sairá pela culatra.

 

Do substantivo plural

Por Jota Mombaça

 

carnaval em chernobyl [ ]

*
falves silvas insolenes
atravessam, diáfanos
a luz deficiente que nos banha as casas
e ruínas,
enquanto eu fumava pedra
na manhã rarefeita

quem te assassinou, cidade,
desde a paíxão-mulher de moacy?
e por que você sobreviveu?*

variação [ ]

*
quem te assassinou, cidade,
desde a saúdade de civone?
e por que você sobreviveu?*

1.
Me veio como um cascudo à cabeça a captura de meia-dúzia de grafiteiros, cujo suposto poder de atualização (da ordem, nesse caso) foi contratado a pintar as paredes da casa onde viveu Câmara Cascudo. Li numa nota publicada pela escanchaneta da família, na qual – aparentemente respondendo a críticas – a pobrezinha choramingava: “por que não?”. Os amigos deram andamento ao drama, munidos de clichês antropofágicos, e forçações de barra: “Cascudo ecoa”. Cascudo porra nenhuma! Anauê coordenador do imaginário, mestre fantasmagórico com ânsias de intrometer-se na totalidade do pensamento coletivo, absoluta bússola. É preciso invadir os latifúndios simbólicos mantidos por este sobrenome. Só aí, quando as cercas forem demovidas, seremos capazes de pensar o impensável do nosso próprio pensamento.

2.
Artista, em Natown, não pensa; reluz apenas. Sérgio Vilar acha que é disso mesmo que o artista se alimenta: holofotes, prêmios, reconhecimento quantificável, notas no jornal,… Quando a FJA comprou um pedaço da Veja para divulgar o Agosto da Alegria, vi no facebook artistas compartilharem a página da revista mais podre do Brasil escaneada, com a seguinte legenda: “nominhos de artistas potiguares aí na veja”. Ora, mas se tem uma coisa em que o atual governo investe é em propaganda. Não acho que seja mérito de artista nenhum ser propagandeado a reboque. Mas artista, em Natown, não pensa; reluz apenas.

3.
Na UFRN, a cafonagem fica por conta de um certo Projeto Conviver, que destaca intelectuais notórios do corpo docente da instituição e os transforma em grandes blocos ilustrados sobre a grama frontal do CCHLA. Por detrás da lógica de homenagens, à sombra de toda nobreza imaginada, o rascunho soberbo de intelectuais higiênicos, que só abandonam seus gabinetes para receber condecorações. São estandartes, avatares de grandeza e erudição concorrendo à imortalidade, fetichistas pseudoaristocráticos protegidos por uma cordilheira de chuvas provenientes da mangueira de agoar grama.

4.
Foi na qualidade de presidente da UBE-RN que – logo após eu ter publicado um drops indigesto criticando não Titina, mas os deslumbrados que a endeusam por estar fazendo bem um personagem ruim numa novela ruim da TV Globo – um tal de Eduardo Gosson escreveu um textículo deslumbrado endeusando Titina por estar fazendo bem um personagem ruim numa novela ruim da TV Globo. Para ele, o brilho conquistado por ela representa uma vitória para o “Elefante”, que finalmente levanta-se de sua “clássica letargia” para “assumir seu destino”.

O Domingão do Faustão é um pódiun onde só pousam vencedores.

5.
A invenção de uma elite cultural autorreferente, que frequente o caldeirão do huck ou a emetevê, e sempremente todos os dispositivos midiáticos e bajulatórios locais, por si só, não instauraria nada, senão um regime lúdico de controles deslumbrantes. *Da antropofagia, a esta altura, ó, meus heróis da antiga geração, somente a náusea resta. Protejam as cabeças, ó, nobilíssimos gigantes da antiga geração, que não há emético para reter o antropoema que minha degeneração ameaça vomitar* Gordos de tantas migalhas, os intelectuais ilustrados nos grandes blocos, o presidente da UBE-RN, ou o nome de Krystal estampado na Veja (e nas propagandas do governo e na música de campanha de Rosalba), os elencos das propagandas eleitorais, os artistas do mercado de trabalho, agarram-se ao parapeito da cúpula de nuvens, onde a cultura potyguar (cópula frígida) projeta para o abismo tudo o que é baldo.

6.
“Eu deserto”, eis o lema inevitável desta estilhaçada geração de borderlines malditos.