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Pussy Riot: o juiz, o bispo, o czar e o silenciamento da crítica

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Na semana que passou, assistimos a condenação judicial da banda punk russa Pussy Riot por prática de “vandalismo motivado por ódio religioso”. Em resposta a uma performance artística motivada politicamente, o Estado russo mobilizou seus diferentes aparelhos de repressão. A finalidade da violência estatal parecia clara: eliminar a crítica ao “príncipe”.

Mas em sua forma racional-legal, o Estado não pode simplesmente exercer a sua violência física sem critérios normativos mínimos de justificação. Ele precisa se apoiar no discurso, segundo o qual age em nome do interesse comum. Daí recorrer ao direito judiciário, a fim de encontrar o apoio institucional (e moral) necessário para praticar o terror.

Na Rússia, foi o que fez o governo Putin ao transferir para a justiça de seu país o julgamento e condenação dos membros da banda Pussy Riot. O crime não era contra o Estado ou contra o governo, mas contra a liberdade de culto religioso. Assim,  um ato político foi julgado como um ato de intolerância e desrespeito religioso.

Embora pareça um paradoxo perverso, temos aqui as novas bases do totalitarismo contemporâneo. Na versão atual do “Leviatã” disciplinado e domesticado, o exercício diário da violência contra qualquer forma de crítica política interna é administrado, levando-se em conta as largas margens de manobra oferecidas pelo sistema jurídico. Principalmente num país onde o corpo de especialistas do judiciário tende a ser corrompido e reflete de modo quase direto os interesses de poder do czar Putin.

Assim, atualizado em novas roupagens, o totalitarismo obscurantista russo exerce a repressão e tenta ornamenta-la com o falso entendimento de que agiu em conformidade com o principio de todo Estado de Direito. Une na mesma trincheira o aparelho de repressão estatal, o ordenamento legal e o fundamentalismo religioso do catolicismo ortodoxo no movimento de silenciamento da crítica estética realizada pelo Pussy Riot.

Seja como for, o mesmo Estado totalitário que se serve da lei pra praticar o terror e o aniquilamento da crítica encontra apoio, aqui no Brasil, numa parcela da esquerda que se excita libidinosamente com as intrigas entre o premiê russo e o governo de Washington. Envenenados pelo anti-americanismo, enxergam em Vladimir Putin, um exemplo de líder nacionalista que não aceita a condição de vassalagem imposta pelo nosso grande irmão do norte das Américas. A cegueira ideológica e o ódio acabam impendido de melhor avaliar o que se desenha na Rússia contemporânea.

Enganam-se todos aqueles identificados com ideais libertários ao acreditarem que Vladimir Putin representa a possibilidade real de retomada do poder “vermelho” no leste europeu. Putin é a reedição do “velho”, sem dúvida. Mas uma velha síntese entre o czarismo obscurantista pré-revolucionário e o totalitarismo contrarrevolucionário.

Entretanto, muito embora faça uso das mesmas técnicas racionais de destruição e barbárie dos “senhores fascistas” do passado, o novo líder carismático russo não é kafkiano, pois não prende sem “motivos”. Na cultura liberal, quando deseja assassinar a crítica, o novo czar recorre ao direito.