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Percalços da igualdade

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Por Paulo Afonso Linhares, Professor da UERN

 

Um dos mais preciosos atributos da democracia é o princípio da igualdade, ou seja, partindo da constatação de que as pessoas são naturalmente desiguais em inúmeros aspectos, a começar pela circunstância de que cada ser vivo tem um código genético que o distingue de todos os outros seres vivos existentes ou que já existiram. Claro, à exceção dos gêmeos univitelinos e obviamente os clones. Portanto, fora destas exceções, não há dois seres humanos com a mesma combinação genética. E mesmo aquelas pessoas – os gêmeos univitelinos – naturalmente idênticas do ponto de vista genético podem se tornar diferentes, porque foi recentemente descoberto que os hábitos e o estilo de vida mudam o comportamento dos genes (cada pessoa tem de 20.000 e 25.000 genes). Assim, as desigualdades sociais, étnicas, econômicas e culturais, finda por estabelecer desigualdade, também, onde a natureza estabeleceu parâmetros genéticos igualitários.

No entanto, a despeito das tantas diferenças, a convivência nas sociedades pretensamente democráticas por definição jurídico-política impõe a igualdade de tratamento para todas as pessoas, mesmo que em alguns casos seja preciso tratar desigualmente os desiguais para igualá-los, segundo fórmula banalizada por Ruy Barbosa. Essa regra da igualdade tanto mais vale quando se trata das questões que envolvem a participação política do cidadão e dos partidos nos processos eleitorais, isto é, de legitimação da representação política. O seu uso, contudo, deve obedecer a certos limites, pena de se tornar algo inútil quando não mesmo grotesco, em algumas situações.

No Brasil, as tentativas legais de homogeneizar coligações, partidos e candidatos, nos processos eleitorais, terminam por gerar situações que beiram o ridículo, inclusive em face da farta utilização, pelos aplicadores do direito, de medidas inequivocamente autoritárias, antidemocráticas. Os debates entre candidatos é um bom exemplo disto. Óbvio, as “acareações” (a palavra “acarear” significa pôr cara a cara duas ou mais pessoas…) que esses debates ensejam poderiam oferecer aos eleitores bons elementos para julgar os candidatos e seus propósitos (ou propostas) políticos e a partir daí basear o seu voto. Lastimavelmente isto quase sempre não acontece, por diversas razões. A primeira delas é que, pela regra da igualdade, todos os candidatos a um determinado cargo (a prefeito, p. ex.), devem ser convidados pelos promotores do debate.

A partir daí são criadas regras, inclusive para racionalizar o pouco tempo que ficará para cada pergunta/resposta, que quase sempre engessam o confronto. O absoluto despreparo de alguns debatedores, para tratar dos temas em discussão, termina por dar tinturas de bufonaria aos debates transmitidos pelas emissoras de rádio e televisão. Os candidatos e suas assessorias já sabem previamente que em nada resultará de útil e esclarecedor (para o público eleitor) esses debates.

O mais interessante é que os candidatos que efetivamente concorrem – com chance de vencer – às eleições, são os que mais se prejudicam, pois aqueles que não têm a mínima possibilidade de serem eleitos são francos atiradores, dizem o que querem, sem compromisso com a verdade ou até mesmo com a mais elementar lógica. Finda mesmo é todo mundo não dizendo nada com nada. E o eleitor, sobretudo, aquele ainda indeciso, fica sem saber para onde caminhar. Embora nos parâmetros da democracia e no respeito à igualdade, geralmente resultam os debates em medíocres e péssimos espetáculos.