Por Paulo Afonso Linhares, Professor da UERN
Depois de perambular por vários presídios federais, finalmente o bicheiro Carlinhos Cachoeira, que tantos sobressaltos tem causado nos meios políticos e empresariais nos últimos dois meses, está livre para voar, digo, para armar as jogadas que quiser enquanto a CPMI que absurdamente leva o seu nome se afunda num pântano de incertezas. E dificilmente cumprirá suas finalidades. Como sói acontecer, a exemplo das comissões parlamentares de inquérito pretéritas, essa será mais uma enorme pizza a envergonhar a nação.
O affair Cachoeira deveria ser no máximo um caso de polícia, jamais se transformar numa comissão parlamentar de inquérito a chamar para si as atenções da sociedade brasileira, como se não tivesse este país magnos problemas a resolver. Caso de polícia tem que se tratado como tal, não com o status de questão política, por mais que os dois lados – situação e oposição – queiram tirar vantagem da situação e infligir danos políticos ao adversário. Todos certamente perderão alguma coisa, alguns até o jeito de andar, como deve ocorrer com o santarrão Demóstenes Torres, já caído em desgraça e abandonado por seus antigos correligionários do DEM e colegas de Ministério Público.
“[…] embora a autoridade seja um urso teimoso, muitas vezes, à vista do ouro, deixa-se conduzir pelo nariz” (Though authority be a stubborn bear, yet he is often led by the nose with gold). Cada vez mais essa assertiva de Shakespeare (Conto de Inverno, ato IV) se torna mais verdadeira, para os observadores pacientes da cena política brasileira nos dias que correm. Sobretudo porque cada vez mais a estrutura do Estado se torna permeável à corrupção de diversos matizes, a despeito dos inúmeros e complexos mecanismos institucionais criados para coibi-la. Uma autoridade que se funda nos privilégios das corporações de servidores do próprio Estado, que finda por construir um círculo de ferro que segrega a grande massa da população e revela a dominação das elites sem nenhuma quebra da base autoritária e paternalista. A propósito, o sábio Renan deixou lançado que “a mediocridade fundou a autoridade” (La médiocrité fonda l’autorité).
A quem interessar possa, nesses discursos de combate à corrupção prevalece mais os arroubos vazios do que a realidade; tem muita cascata e pouco espírito público. Pessoas do calibre de Carlos Cachoeira são uma síntese da relação espúria entre o poder e setores do crime organizado. Lastimavelmente a CPMI do Cachoeira sequer isto pode evidenciar, como lição de cidadania. Nada de útil deverá deixar. E agora é o próprio Cachoeira solto de canga e corda. Coisas deste Brasil sem porteira.