Por Paulo Afonso Linhares, Professor da UERN
Um capítulo bem interessante da absurda judicialização da vida na sociedade brasileira é referente ao processo eleitoral. Não resta dúvida de que a fundação da Justiça Eleitoral, na década de 1930, bem assim a sua ótima estruturação nestas duas últimas décadas, com a adoção do processo eleitoral eletrônico, dois inegáveis avanços das instituições políticas brasileiras, cada uma a seu tempo.
A tradição autoritária das elites deste país impõe, de modo recorrente, a tutela estatal de todas as atividades socialmente relevantes. Essa dominação sempre lastreada em enorme aparato legal quase sempre atropela princípios fundamentais que compõem a superestrutura jurídico-política, aí incluída a própria Constituição da República. Um exemplo disto é o que vem ocorrendo com o aparato de arrecadação de tributos federais e estaduais. Favorecido pela informatização, o Fisco brasileiro, sobretudo a estrutura mantida pela União Federal, mantém uma presença crescente e mais avassaladora como jamais foi possível na História. Aliás, não há exagero algum na assertiva de empresários de que o governo é sócio de todos eles, tal é o controle que a máquina fiscal tem da atividade privada, como se fosse um Big Brother ( o de George Orwell, não o da Tv Globo) ultra eficiente, que tudo sabe, que tudo percebe e que cobra as contas salgadas. Em suma, o Brasil está muito longe daquilo que se conhece como Justiça Tributária.
Outro aparato igualmente avassalador e cada vez mais invasivo da esfera privada é o da Justiça Eleitoral. Começa pelo prerrogativa legal de regulamentação que tem o Tribunal Superior Eleitoral, quando baixa resoluções explicitando aspectos da legislação eleitoral que, na maioria das vezes, vão muito além do imaginou o legislador. Na verdade, as resoluções de TSE tradicionalmente estabelecem regras que diferem muito e em tudo das normas regulamentadas.
O mais grave é que essas resoluções veiculam regras muito severas e que, lidas à risca, podem desfigurar o processo eleitoral, impondo um rigoroso engessamento às atividades de partidos e candidatos. Estes, sobretudo, devem acercar-se de enormes cuidados tanto na divulgação e propaganda, quanto mesmo com a captação de recursos para a campanha e a contabilização de todas essas movimentações financeiras obedecendo a um intrincado cipoal de regras que, de tão complexas, obriga que cada candidato tenha, no mínimo, o seu próprio contador. Tudo isso para garantir a igualdade de tratamento de partidos e candidatos, evitando o abuso do poder econômico e político.
No futebol, quando o árbitro quer ter mais destaque em sua atuação que os jogadores, o mais que consegue é estragar o espetáculo esportivo. Assim pode ser a atuação da Justiça Eleitoral/Ministério Público Eleitoral que, de posse de um arsenal de normas draconianas, pode tornar muito difícil as vidas de partidos, candidatos e até mesmo da imprensa faz a cobertura das eleições. Enfim, se com isso conseguir uma redução dos vícios que cercam esses processos, como o clientelismo e a compra de votos, terá valido a pena, especialmente se mantiver incólumes as bases democráticas de uma festa cujas estrelas devem ser unicamente os partidos, os candidatos e, sobretudo, o povo eleitor.