Por Paulo Afonso Linhares, Professor da UERN
O nosso RN acomodado nessa esquina de Brasil é sabidamente riquíssimo em dotes naturais, que se transmudam em diversas vocações econômica, que vão da agricultura de subsistência à exploração de minerais estratégicos, como o tungstênio, ou nobres, como o ouro, passando pela commodity mais importante do mercado mundial que é o petróleo. Além do mais, é o Estado brasileiro de maior área costeira, onde exibe um rosário de praias cujas paisagens são quase antecipações da visão do paraíso.
Todavia, o RN sempre foi de modestas posses noutros itens vitais, bem atrás da maioria dos outros Estados nordestinos: na literatura, parece que somente se salva essa unanimidade que atendia pelo nome de Luiz da Câmara Cascudo, autor de portentosa obra de prestígio aqui e alhures; no direito, tivemos uma tradição de bons administrativistas, com destaque para o ex-ministro do STF, Amaro Cavalcanti e, sobretudo, Miguel Seabra Fagundes, autor do clássico O Controle dos atos administrativos pelo poder judiciário. Certamente o mais brilhante jurista potiguar, Fagundes tornou-se desembargador da Corte de Apelação (hoje Tribunal de Justiça) do Estado com apenas 25 anos, em 1935. Dez anos depois, foi nomeado governador do RN por Getúlio Vargas. Foi ainda Ministro da Justiça e de Negócios Interiores do Brasil, no governo Café Filho.
Ressalvadas essas exceções, nada de expressivo teve o RN. Sem grandes vultos na área jurídica, entretanto, sempre contou com bons juízes, advogados e promotores de justiça. Instalado em 1° de julho de 1892, o Tribunal de Justiça pode ser considerado como uma das boas cortes judiciais do Brasil. Como órgão de cúpula do Poder Judiciário estadual, o TJRN comanda um sistema que envolve 65 comarcas e 170 magistrados em atividade, aliás, número bem inferior ao necessário para normal funcionamento do sistema estadual de justiça.
Talvez seja agora um dos momentos mais difíceis porque passa a magistratura potiguar, quando chega à opinião pública a revelação do escândalo que envolveria o desvio de cerca de 20 milhões de reais no setor de pagamento de precatórios, com acusações que atingem dois destacados – ex-presidentes – membros do TJRN. Os desembargadores Rafael Godeiro Sobrinho e Osvaldo Cruz respondem a processos instaurados no Conselho Nacional de Justiça e no Superior Tribunal Justiça. Esão presumidamente inocentes até prova em contrário; usando das garantias da ampla defesa e do contraditório, se defenderão das imputações que lhes faz a servidora Carla Ubarana, o pivô desse escândalo milionário. Qualquer que seja o resultado, espera-se um julgamento justo, sem mais nem menos. Justitia fiat!
Aguarde-se o desfecho das apurações e as conclusões a que chegarão os colegiados antes referidos. Farão, decerto, julgamentos justos. Os julgamentos antecipados de algumas mídias sensacionalistas não devem ser levados em consideração, a despeito do constrangimento que tudo isso vem causando aos magistrados deste Estado, pessoas probas e cumpridoras de seus deveres funcionais, que nada têm a ver com os lastimáveis fatos mostrados em rede nacional de televisão, com todas as cores do cinismo da servidora Carla e de seu esposo Jorge que, acobertados pela delação premiada que negociaram com o Ministério Público, fizeram relatos estarrecedores de como o dinheiro publico foi torrado em viagens e artigos de alto luxo.
Em sua grande maioria, os magistrados do RN, mulheres e homens, nada têm a ver com essas patifarias. E continuarão a prestar relevantíssimos serviços ao seu povo. Por isto, devem erguer a fronte e seguir adiante, sem vergonha alguma da toga que envergam e sem remorsos por aqueles que, porventura, não tenham dela sido dignos; se tiverem que jogar foram alguns frutos apodrecidos que o façam com destemor, porém, sempre e sempre, com Justiça. A cidadania deste RN deve muito à sua magistratura, aos seus juízes, mulheres e homens valorosos, à altura do brado que ressoa dos quatro primeiros versos do nosso hino: “Rio Grande do Norte esplendente / Indomado guerreiro e gentil, / Nem tua alma domina o insolente, / Nem o alarde o teu peito viril!” Sem favor ou bajulação pequenos, tenho dito.