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Uma velha carta potiguar nas gavetas da memória

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Vez por outra abro as gavetas da memória e encontro numa velha cômoda colonial, coisas, escritos que me fazem viajar no tempo. Muito tempo. Afinal de contas sou um velho. Na última quarta feira de cinzas, sem nenhuma ressaca (eu não gosto de Carnaval), aproveitei para mexer nestas gavetas. Achei uma carta do poeta, escritor, amigo e multi criativo Mário Rasec, escrita alguns anos atrás. E resolvi, sem permissão do autor, publicá-la. Logo hoje Rasec quem escreve neste meu espaço no site CARTA POTIGUAR. Eis a carta:

 

“É um salto sobre as nuvens ler suas cartas. Suas palavras me tiram do cotidiano com agressividade e me faz lembrar o que eu sou. O que realmente somos. Confesso que achei que havia me cansado da poesia. Depois vi que não era da poesia que eu estava cansado. Era dos poemas. Dos poemas sem poesia que tenho visto por aqui. Eu não conheço a poesia de Carlos Guimarães nem a de Sanderson (a não ser um poema em algum periódico há muito tempo), mas a de Zila eu adoro, Cyrillo é uma descoberta fascinante, uma paixão mais ou menos recente. A poesia dele é onipresente para mim, pois está no meu inconsciente a todo tempo, e quando eu o li pela primeira vez, senti uma familiaridade mística e emocional. Quanto a Fontelle, eu lembro ter visto na TV CULTURA há muito tempo uma matéria sobre o livro (Teia). E essa “teia”, embora eu não tenha o livro (ainda, pois ainda não encontrei por aqui, mas faz parte da minha lista de futuras aquisições), grudou no meu inconsciente e, de uma forma que eu não saberia explicar, inspirou a vontade de escrever. Pois lembro agora dos meus primeiros escritos (à máquina de escrever também), em noites de chuva e calor e solidão no meu antigo quarto nas Rocas, meio escuro, ouvindo o som fragmentado que vinha da rua às 6 horas da tarde. Pensando antes de escrever em cada poema da reportagem sobre Orides Fontelle, sobre seu exílio num quarto de hotel (quarto este pago pelos amigos e admiradores, já que no Brasil os artistas bem pagos não são necessariamente os bons artistas. Geralmente o lucro é dividido entre os medíocres que idiotizam a massa e pela massa são idiotizados). É essa lembrança que eu tenho dela. E se a minha poética tem seus progenitores, seria a solidão daqueles dias e ela, Orides Fontelle e sua teia que nunca li.”

 

“Outra descoberta rara que você cita na sua carta e que me atordoou, como se atordoam os que se apaixonam, foi Artaud. Foi uma descoberta quase que por acaso, de onde eu não esperava muito, embora uma amiga (que por sinal gosta muito do seu “caderno amarelo”), seja entusiasmada. Esses ascetas da arte como Van Gogh, são os que me emocionam mais do que qualquer outro. Nada há de mais universal quanto a dor humana”.