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Obras de mobilidade: quem precisa delas?

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Obras de mobilidade. Esta é a nova moda das reivindicações da sociedade. Se antes a luta era por alimento, saneamento, calçamento, desaparecimento (de alguns gestores), agora os reclamos pedem por movimento.

À primeira vista parece-me que é uma coisa justa e necessária. Mas convenhamos, será mesmo tão urgente assim? Analisemos.

As avenidas estão entulhadas de carros? Os viadutos não dão conta de todo o tráfego? Os túneis e pontes já não suportam mais? O transporte de massa é uma bela porcaria?

Sim, tudo isso parece ser a mais pura verdade. Mas a Copa do Mundo vem aí, amigos! As ruas estarão cheias de gringos e torcedores, inclusive nós mesmos, entusiasmados com os jogos no nosso estádio novinho em folha e curtindo as férias coletivas que o governo provavelmente irá decretar para tirar alguns milhões de carros de circulação, escondendo o problema como o mágico que entoca um coelho na cartola para ludibriar os espectadores.

Portanto, nada de gastar bilhões em obras de mobilidade que servirão apenas para nós mesmos! Bom mesmo é maquiar, embelezar a buraqueira e a intrafegabilidade das nossas vias públicas, liberando-as temporariamente para inglês, norueguês e congolês ver. Só brasileiro é que não poderá ver, já que a rigor nada vai mudar. Encerradas as férias, tudo volta a ser como era antes, e nós, apegados às coisas do passado, iremos suspirar de alívio por não terem mexido nas nossas amadas estruturas, mantendo-as intactas e excluindo a possibilidade de no futuro sentirmos saudades dos tempos passados ao vermos fotografias antigas, aquelas dos bons tempos, “quando Natal prestava”.

Eu é que não quero chegar aos setenta anos e ter que me deparar com uma Prudente de Morais diferente da que amo hoje! Quero também sempre ter a ventura de conviver com a ótima educação que os conterrâneos demonstram no trânsito!

Vão pra lá aves de mau agouro! Urubus sedentos por carniça! Deixem nossas avenidas em paz! Quero a minha velha Salgado Filho intacta, hein?! Aah, que romântico é aquele cruzamento dela com a Bernardinho Vieira… Quanto tempo meu carro passou agarrado àquele espaço, embriagado de amor pelo asfalto, e sempre teimando em deixar o conforto daquele regaço…

Ah, Ponte de Igapó querida, que maravilha é desfrutar do visual límpido do Potengi acomodado confortavelmente em um ônibus praticamente vazio e seguro…

Emaús e Maria Lacerda, o casal mais celebrado do estado, enlaçado por um semáforo que ilumina e prende as testemunhas desse amor na entrada de Natal.

Gancho, Gancho, é em você que eu me escancho! Laivos de prazer invadem nossas veias a cada passagem daquele maravilhoso sinal de duzentos tempos que nos sorri verdinho de hora em hora.

Não! Nenhum reclamão vai tirar de mim a vivência desses momentos românticos só porque quer se movimentar melhor pela cidade. Ora, mas que mesquinharia! Demolir tanta história tatuada nas ruas e avenidas da cidade por um desejo tão miúdo!

É por isso, meus amigos, que essa cidade não vai pra frente. E não é por causa do trânsito que segura os carros, e sim pela mentalidade tacanha de alguns conterrâneos que se apegam até aos modismos reivindicatórios.

Graças a Deus que os gestores paquidérmicos são solidários ao meu pensamento, e pelo jeito as tão cobradas obras de mobilidade urbana não devem sair neste século.

É uma boa notícia, além de alívio!.