Eu já havia criticado aqui sobre uma certa “americanização” do cinema brasileiro. Fui mal compreendido. Eu não me referia a técnica, muito menos ao um típico filme de gênero, mas a falta, digamos, de um certo “tempero” característico no cinema nacional, os elementos que o diferenciam, que alguns filmes perderam ao tentar imitar demasiado a linguagem hollywoodiana. Entretanto, posso dizer que a ausência desses elementos que façam diferenciar o cinema feito aqui no Brasil com o cinema em qualquer parte do mundo não se repete em 2 Coelhos, apesar dos seus inúmeros efeitos visuais, do gênero e do seu ritmo comum aos filmes de ação norte-americanos. Assim como em Tropa de Elite (2007), ainda há algo que remete as características da nossa brasilidade, sejam os problemas sociais ou mesmo nosso típico modo de agir e falar. Pois acredito que, por mais que as produções cinematográficas brasileiras se tornem ricas financeiramente, e que com isso lancem cada vez mais mão de efeitos visuais somente vistos nas riquíssimas produções hollywoodianas, mais do que nunca devemos mostrar ao mundo um cinema que tenha uma “aura”, um estilo que se faça diferenciar das outras produções estrangeiras, e não ser uma simples repetição destas.
Por isso eu acredito num cinema nacional de gênero, seja de terror ou policial, um cinema rico em efeitos visuais, mas com cuidado em dar mais atenção ao que é mais importante: a narrativa, o roteiro, a história. Confesso que quando vi o trailer de 2 Coelhos, ao mesmo tempo em que achei interessante o ritmo e a qualidade visual do filme, fiquei muitíssimo desconfiado de que o cuidado com os afeitos visuais não fosse o mesmo dedicado ao enredo. Entretanto, seu diretor e roteirista Afonso Poyart me surpreendeu ao fazer um filme criativo em todas as suas camadas, do roteiro a montagem, e se por alguns momentos essa mesma criatividade parece perder um pouco o rumo ou a coerência, por outro seu propósito final é justificado.
Com uma profusão de personagens, sendo os mais importantes justificados por uma constante narração em off (narração esta que se mostra necessária dado a uma trama aparentemente confusa e com uso constantes de flashbacks, numa linha narrativa não tão linear e com situações que remetem a Tarantino), 2 Coelhos conta a aventura de Edgar (Fernando Alves Pinto) em roubar o dinheiro de um perigoso bandido, dinheiro este que está sendo levado para um deputado corrupto. Essa breve sinopse é o básico do básico que eu posso revelar, já que há tantas reviravoltas que, ao dizer mais do que isso, eu poderia estar cometendo um spoiler.
Sustentado por um elenco competente, bem construído e desenvolvido, em que até os personagens menos importantes contribuem bastante com a narrativa (narrativa esta que torna impossível não lembrar de Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes (1998) de Guy Ritchie), 2 Coelhos usa recursos gráficos nunca vistos no cinema nacional, se apropriando até mesmo, de maneira ousada e criativa, do universo dos Games, e, principalmente, com o grande mérito de não ser apenas um filme com algumas explosões e um visual bacana.
2 coelhos (Brasil, 2011)
Direção: Afonso Poyart
Roteiro: Afonso Poyart
Elenco: Alessandra Negrini, Caco Ciocler, Fernando Alves Pinto, Marat Descartes, Neco Vila Lobos, Roberto Marchese, Norival Rizzo, Thogun, Thaíde, Yoram Blaschkauer, Robson Nunes, Aldine Muller