Por Evelyn Pedrozo
A “lista suja” de pessoas físicas e jurídicas flagradas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em ato de exploração de mão de obra análoga à escrava foi acrescida de 52 nomes em 2011, totalizando o número recorde de 294 infratores. Foram retirados apenas dois empregadores, que cumpriram os requisitos para a exclusão. O baixo número deve-se, grande parte, à não quitação das multas aplicadas. Segundo o ministério, nunca houve tanta irregularidade ao mesmo tempo.
O cadastro é utilizado pelas indústrias, varejo e exportadores para a aplicação de restrições e para não permitir a comercialização dos produtos oriundos do uso ilegal de trabalhadores. O Pará lidera a lista, com nove inclusões, devidas ao trabalho de desmatamento da mata amazônica. A Construtora BS, contratada pelo consórcio Energia Sustentável do Brasil (Enersus), foi flagrada utilizando 38 escravos na construção da Usina Hidrelétrica de Jirau. Entre os novos, estão usineiros, madeireiras, empreiteiras, médicos, políticos, famílias poderosas e casos de exploração de trabalho infantil e de trabalho escravo urbano.
O chefe da Divisão de fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo do MTE, Alexandre Lyra, observou que o setor pecuário está no topo da lista, pelas más condições oferecidas aos trabalhadores nas capinadas para pastagem do gado, seguido de perto pela indústria sucroalcooleira, madeireiras e carvoarias. O executivo mencionou um flagrante registrado em outubro passado, em Goiânia (GO), onde trabalhadores de uma usina de açúcar chegavam a cumprir 19 horas de jornada diária no setor industrializado. “As pessoas acreditam que o pior acontece na lavoura, mas esse caso mostrou uma outra faceta”, disse.
O cadastro foi criado em 2004. Ao ser incluído, o infrator não pode mais obter empréstimos em bancos oficiais do governo e também entra para a lista das empresas pertencentes à “cadeia produtiva do trabalho escravo no Brasil”.
As denúncias chegam ao órgão pela Secretaria de Inspeção, pelas superintendências regionais do Trabalho e Emprego ou por instituições parceiras, como a Comissão Pastoral da Terra, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal e Departamento de Polícia Federal.
Em geral, trata-se de falta de condições de higiene, saúde e segurança, alojamentos inadequados, falta de higiene, com ausência de água potável e banheiros, cerceamento do direito de ir e vir com a retenção de documentos, vigilância ostensiva com uso de armamento e falsas promessas aos migrantes. “A gente encontra trabalhadores em situações tão degradantes que é possível dizer que os escravos tinham mais valor que eles, hoje tratados como coisas, descartados”, declarou Lyra.
As inclusões no cadastro são efetuadas com base em pesquisas realizadas no Sistema de Acompanhamento de Combate ao Trabalho Escravo, consultas no Controle de Processos de Multas e de Recursos e no Setor de Multas e Recursos das Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego (antigas DRTs), além de consultas a banco de dados do governo federal, como o da Procuradoria da Fazenda Nacional.
Para o ministério, também preocupa o fato de o trabalho escravo ser encontrado nas cidades, o que já suscitou maior fiscalização na área urbana. A indústria têxtil destaca-se nesse caso pela exploração da mão de obra de imigrantes latinos, e a construção civil, pelos abusos cometidos com os nordestinos.
A lista do MTE passa por atualizações maiores a cada seis meses. Os nomes são mantidos por dois anos e, caso o empregador não volte a cometer o delito e tenha pago devidamente os salários dos trabalhadores, o registro é excluído. A inclusão do nome no cadastro ocorre após decisão administrativa relativa ao auto de infração, lavrado em decorrência de ação fiscal, em que tenha havido a identificação de trabalhadores submetidos ao “trabalho escravo”.
Na lista, segundo apurou a agência Repórter Brasil, estão um ex-prefeito, um ex-secretário municipal do Meio Ambiente e dois médicos. O ex-prefeito Edmar Koller Heller foi flagrado em 2010 explorando trabalhadores em um garimpo na Fazenda Beira Rio, em Novo Mundo (MT), a 800 quilômetros da capital, Cuiabá, próximo à divisa com o Pará. Edmar foi prefeito de Peixoto de Azevedo (MT) em 2000, pelo extinto PFL (hoje DEM). Teve o mandato cassado após acusação de desvio de recursos públicos, contratação de pessoal especializado sem licitação e contratação ilegal de veículos automotores de auxiliares de confiança.
Em 2007, ele se envolveu em outro escândalo político e chegou a ser preso. Como secretário de Administração da prefeita Cleuseli Missassi Heller, sua esposa, ele foi considerado responsável por improbidade administrativa, configurada pelo favorecimento de uma única empresa em processos licitatórios do município. Em 2009, a Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso manteve a condenação.
As exclusões resultam do monitoramento por dois anos desde que não haja reincidência na prática. Outra condição é o pagamento das multas e comprovação da quitação de débitos trabalhistas e previdenciários. Nesta atualização, saíram do cadastro Dirceu Bottega e Francisco Antelius Servulo Vaz.
Resgate
O Grupo Especial de Fiscalização Móvel do ministério resgatou, até 29 de dezembro, 2.271 pessoas encontradas em situação degradante de trabalho em 158 operações em 2011. Foram pagos mais de R$ 5,4 milhões em indenizações trabalhistas e inspecionados 320 estabelecimentos, segundo dados da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo. Entre 1995 e 2011, já foram resgatados 41.451 trabalhadores em todo o país, totalizando 1.240 operações.
De acordo com Lyra, a atuação do MTE é repressiva. “Nós afastamos os trabalhadores das condições inadequadas, acompanhamos a rescisão contratual, emitimos a guia de seguro-desemprego e as multas”, afirmou.
Matéria publicada na Rede Brasil Atual