O impacto das redes sociais neste começo da segunda década do século XXI extrapola o que se definiria como o âmbito de suas funções cotidianas e individuais. Não se trata tão somente de interconectar amigos, manter amizades, conhecer novas pessoas, e com estas compartilhar o nosso dia-a-dia e nossa vida pessoal por meio de recados, piadas, fotografias etc.. Ainda que esta interação trivial forme a base das redes sociais, estas são, ocasionalmente, diga-se, mais do que isso.
Isto porque, nos dias que correm, a comunicação instantânea e o compartilhamento de informações assumem um lugar central e exaustivo em diferentes esferas da vida. A disseminação de tecnologias da informação e comunicação criaram uma economia informacional que penetra, interliga e sacode o que antes possuía fronteiras mais ou menos claras: o mundo do trabalho, a cultura e as relações sociais cotidianas. Enquanto alguns saúdam todo o potencial que provêm disto, outros lamentam e alertam sobre seus perigos e consequências. Porém, no tocante às redes sociais, ambos concordam que, para o bem e para mal, elas são os protagonistas da vida social desse começo de século, dado a importância que adquiriram e as repercussões que são capazes de catalisar.
É este último ponto que gostaria de explorar; as redes sociais como catalisadores sociais. São catalisadores para uma infinidade de coisas; desde associações entre pessoas e dados à ideias, opiniões, sentimentos traduzidos em caracteres e bytes, ou seja, em informação passiva de visualização, assimilação e difusão. As redes sociais aceleram e articulam o que habita a vida social e as mentalidades de forma difusa. É aí que reside, chamemos assim, sua ambigüidade política.
Se, por um lado, como atestam os últimos movimentos, contestações políticas e ocupações de Tahir, Madrid à Nova York, as redes sociais aglutinam as indignações e os sentimentos de injustiça dando-lhes, rapidamente, uma forma compartilhada e mobilizável a disposição de um conjunto amplo de pessoas, também é verdade que elas aglutinam os ódios e os ressentimentos diluídos na sociedade; vide, no Brasil, os últimos exemplos das eleições presidenciais, as manifestações de preconceitos contra os nordestinos, o “Lula, trate-se no SUS”, entre outros.
As redes sociais funcionam, a um só tempo, como catalisadores dos desejos contestatórios e ímpetos emancipatórios assim como dos fascismos sociais e das intolerâncias. Essa sua ambigüidade é assustadora. Não é somente o predomínio temporal e espacial da “besteira”, do supérfluo e do trivial nas redes sociais. O mais problemático e assustador diz respeito a esse caráter paradoxal de uma faca de dois gumes que as redes ensejam no seu campo de possibilidades. Historicamente, o fascismo e regimes autoritários sempre nascem da aglutinação do ódio e do ressentimento dirigido contra o outro (s). E, aqui, ensina-nos a história, as tecnologias da propaganda e da publicidade cumpriram um papel fundamental para essa aglutinação e liberação. Como se sabe, os regimes nazis-fascistas fizeram largo uso da propaganda e da publicidade pra incutir e difundir medo, preconceito e estigmas.
Portanto, do ponto de vista político, há um elemento trágico nas redes sociais; de um lado, elas possibilitam a articulação de condições importantes para a mobilização em favor de reivindicações e lutas por maior democratização dos espaços, das atividades e das decisões, porém, de outro, a mesma capacidade técnica serve também para o incremento e a materialização do ódio e, logo, do fascismo cotidiano. A questão fundamental consiste em saber até que ponto a catalisação e aglutinação dos ódios, preconceitos e ressentimentos pelas redes sociais, tudo isso que forma os fascismos cotidianos nos corações e mentes das pessoas comuns, é capaz de incrementar o surgimento de regime autoritário? Se, de fato, elas podem contribuir para a democracia, será que o inverso também pode ser verdadeiro?