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Os vampiros do cinema

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A figura do bebedor de sangue imortal já assombrava o folclore europeu muito antes de Bram Stoker se inspirar no príncipe romeno Vlad Tepes para criar seu Drácula. Entretanto, este foi certamente responsável pela popularização do vampiro na cultura mundial, na literatura e, principalmente, no cinema.

A primeira investida do cinema nessa vertente do terror foi com uma tentativa de adaptar a obra de Stoker. Contudo, não obtendo os direitos necessários, o diretor F. W. Murnau mudou o título e alguns detalhes da obra original e com isso, em 1920, surgiu um clássico do cinema expressionista alemão: Nosferatu. Filme este que se tornou, junto com o livro de Stoker, um cânone das características do morto-vivo bebedor de sangue no cinema mundial. Depois, em 1930, Vampyr de Carl Theodor Dreyer explora o tema vampiresco (neste filme há recursos expressivos bastante interessantes como as sombras que se movimentam de forma independente, elemento este que será usado por Francis Ford Coppola no seu Drácula de Bram Stoker). E, em 1931, a obra de Bram Stoker é adaptada com seu título original com Bela Lugosi interpretando o conde imortal.

No fim dos anos 1960, e em todo 1970, os filmes de vampiro saturaram o cinema mundial. França, Itália e principalmente Inglaterra, através do selo Hammer  que levou Christopher Lee a ser um dos ícones do cinema de terror, lhe eternizando como Drácula. Foi o tempo também de uma maior erotização do universo vampiresco. São inúmeros filmes em que a sensualidade, a nudez e o sexo são explorados tendo um pano de fundo gótico, ruínas de castelos medievais, e vampiras lésbicas surgindo nuas em várias produções, principalmente na fascinante produção do diretor francês Jean Rollin. O vampirismo havia se tornando um bom motivo para tirar a roupa de belíssimas atrizes nesta época (em Twins of Evil de 1972, a Hammer utiliza as playmates da Playboy de outubro de 1970, Mary e Madeleine Collinson, como as gêmeas do título original, sendo traduzido aqui como As Filhas de Drácula, mesmo que este personagem nem dê as caras nesta produção).

Entretanto, na literatura e conseqüentemente no cinema, ninguém fez tão bem a imagem do vampiro quanto a escritora norte-americana Anne Rice. Tendo um ótimo diretor como Neil Jordan que soube retomar o glamour perdido desses imortais, com o ótimo roteiro da autora, Entrevista com o Vampiro (1994) se tornou um dos melhores filmes sobre o gênero já produzidos e que, através da obra de Rice, coloca os vampiros num nível filosófico pouco ou jamais visto em obras anteriores, onde os personagens são atormentados sobre questões existencialistas, sobre o bem e o mal, a religião, as mudanças rápidas do tempo e seus efeitos sobre seres que, embora imortais, têm dificuldade em se adaptar ao mundo em constante mudança.

A respeito das características que formam o personagem vampiresco, engana-se quem acha que Stephenie Meyer cometeu um grande pecado ao fazer seus vampiros caminharem durante o dia no seu medíocre Crepúsculo. Originalmente, na obra de Bram Stoker, o sol não era um elemento mortal ao vampiro. Elemento que surgiu no filme Nosferatu. Com isso vemos que, mais do que a obra literária e a superstição medieval, é o cinema que cria, destrói e recria as características de tal personagem. Entretanto, o maior crime que a mórmon Stephenie Meyer cometeu, foi usá-los como uma espécie de propaganda cristã contra o sexo antes do casamento. Contudo, tal estratégia não é facilmente percebida pelo grande público, principalmente pelo público ao qual a série se destina. Pois, para o grande número de adolescentes que cultuam a série, o elemento vampiresco é um mero detalhe sem importância tão fundamental aos interesses delas. Afinal, é a beleza dos atores e o romantismo patético da obra que as atraem para o cinema. O paradoxal elemento anti-sexual de um personagem permeado de sexualidade como o vampiro, é passado despercebido pela grande maioria. Por isso é necessário olhar o vampiro através da sua simbologia e ver o quanto de um erotismo óbvio ele expõem através de sua sedução e da penetração de suas presas no pescoço da vítima. Por isso, como cristã, não é por acaso que Stephenie Meyer adie ad infinitum que o vampiro Edward penetre suas presas na humana Bella (há uma cena no primeiro filme em que eles censuram o próprio desejo e passam a noite conversando no quarto. Se isto não for pregação cristã contra o sexo antes do casamento, nada mais é!). Outro ponto que sustenta este meu argumento é o fato do protagonista vampiro ter 100 anos e ainda ser virgem… No entanto, a série cinematográfica Crepúsculo não deixa de ser importante para o gênero dos filmes sobre vampiros, pois mostra (com sua incompetência narrativa e seu moralismo inapropriado) o que não deve ser feito em tal gênero.

Após Crepúsculo parecia que os vampiros haviam encontrado sua derradeira decadência, eles haviam se tornado bobos, representando o universo adolescente contemporâneo (e ainda freqüentando até a escola!), totalmente adaptados para o consumo teen. Mas, para a sorte dos vampiros, no cinema sueco surge o belíssimo Deixe Ela Entrar. Filme que se torna a verdadeira redenção do gênero após o estrago de Stephenie Meyer e outras medíocres produções norte-americanas para TV (como um tal Vampire Diaries).

O cinema vez por outra se volta a esse tema ora com grandes obras, ora com uma profusão de bobagens que saturam a imagem do vampiro (expondo-os à luz e a purpurina das idiotices do mercado teen hollywoodiano). Mas uma coisa é certa, o vampiro é um tema que nunca deixará o cinema, pois, de certa forma, ele faz parte da história do cinema, desde o expressionismo alemão até os filmes para adolescentes norte-americanos, passando por impecáveis produções européias como Deixe Ela Entrar.