Search
Close this search box.

Luta de classes, parrachos, cajueiro, teatro riachuelo e outras análises

Compartilhar conteúdo:

Chateada com a “invasão” que vem sofrendo pela “nova classe média”, a classe média tradicional só endurece o seu discurso e suas visões de mundo. Este fenômeno é dos mais interessantes, já que atravessa parte significativa da sociedade e está na origem de violências simbólicas que inúmeras pessoas vêm sofrendo. Tema que borbulha na sociologia contemporânea.

Ora, esta disputa entre as classes por espaços e pela demonstração de uma suposta “superioridade natural” perpassa o nosso cotidiano, a página dos jornais, etc.

01. Aquela discussão sobre os parrachos de Pirangi, que invadiu os jornais há algum tempo atrás é bastante significativa. Eles sempre foram explorados pelos antigos veranistas da região. Nada de problema. Porém, a chapa começou a esquentar quando os “novos moradores” começaram a aparecer. Aí toda uma celeuma foi criada. A necessidade de normatizar o uso daquelas pedras no meio do mar se tornou algo inadiável.

Os clamores eram ouvidos em todas as colunas. Coisa histérica mesmo. Lembro de uma jornalista dizendo que aquilo era um absurdo, pois “‘aquelas pessoas’ vinham com suas lanchas, ouvindo som alto e tomando cerveja retirar a tranquilidade do local”. Mais explícito impossível.

02. A questão do cajueiro, que todo final de ano, quando os veranistas passam por ali, tem seu caule ameaçado é outro bom exemplo. Nunca vou esquecer de um comentário de um amigo “sobre os novos visitantes da citada praia”. Disse ele: “Rapaz, pirangi não presta mais, não!… Tá chegando ônibus coletivo”.

03. É importante também não esquecer dos bares e restaurantes da cidade. A luta para buscar um “local só seu” é algo que movimenta a noite de Natal e aguça o “vanguardismo” da classe média estabelecida. A vida curta de parte dos bares se deve a isso.

04. O teatro riachuelo soube explorar bem o desejo daqueles que buscam “superioridade”. Movido por manifestações da indústria cultural, a casa de shows é a última expressão da mediocridade do natalense. Geralmente, não sempre, óbvio!, cheio de formas e preconceitos, mas vazio de conteúdo.

o teatro é a expressão da farsa, conforme disse em outro texto e vou mais uma vez reproduzir aqui, de um complexo de lojas que foi construído e se tornou uma verdadeira tragédia para a mobilidade urbana de Natal.

O Midway, que teve sua construção reprovada por todas as instâncias competentes do RN (secretarias municipais, estaduais e pelos departamentos especializados da UFRN), foi empurrado goela abaixo de muita gente.

O “Muito mais Shopping”, como a sua publicidade modestamente o chama, fechou o principal corredor da cidade, dificultou ainda mais o acesso a já escanteada zona norte e travou a Av. Hermes da Fonseca, que liga a Zona Sul a Zona Leste.

O shopping afetou fortemente a nossa qualidade de vida sob a idéia de que estava criando empregos (cultivo cada vez mais medo deste argumento). O seu dono é saudado como um benfeitor por não ter levado (infelizmente!) o seu filhote para outro estado.

Sinal axiológico de modernidade para alguns, objetivamente, o Midway Mall piorou as condições de vida da maioria dos natalenses.

Há quem diga, esquecendo da história e do papel hoje desempenhado pelo monstrengo, que o trânsito está como está porque pobre passou a ter dinheiro para comprar carro.

Nessa lorota, meus caros, eu não vou cair.

O teatro riachuelo, é bom lembrar, está alicerçado nessa conversa pra boi dormir.

Minha análise não se relaciona com nenhum tipo de repulsa em relação a classe média tradicional, conforme fui acusado por leitores em textos anteriores.

Ainda que tenha presenciado trabalho quase que escravo nas aparentemente insuspeitas casas do bairro de cidade jardim, minha preocupação, vale deixar claro, é de apontar o modo como o endurecimento dos tradicionais, na tentativa de fechar a porta para terceiros, que, com a mobilidade social no Brasil ocorrida nos últimos anos, são muitos, acabam apoiando todo tipo de ataque e desqualificação contra aqueles que, para manter o novo nível de vida alcançado, ralam pra cacete!

O negócio é que os preconceitos contra a nova classe média se tornaram “naturais” de tão banalizados que foram.

Afinal, quando alguém da fina flor natalense não quer ir para um local já “invadido” pelos batalhadores, como o sociólogo norte-riograndense Jesse Souza, que renova o pensamento social brasileiro e brilha nas principais universidades do Brasil, mas é um desconhecido por aqui, conceitua os que recentemente subiram socialmente, usa a frase-mor do racismo de classe de nossas bandas.

“Vou nada. Lá já está muito misturado“.